23 de agosto de 2007

A visão clássica da política

Ao falar de Estado, eu sempre comento o fato de que, quando falamos sobre tal instituição, estamos nos referindo a uma instituição com características surgidas a partir do século XIV na Europa ocidental. Mas isto não significa dizer que, antes de tal período, não houvesse um pensamento político sobre a instituição que garantiria a ordem da sociedade. É claro que tal pensamento existia antes, na chamada "visão clássica da política". Esta visão tem em Platão seu principal representante.

A visão clássica da política baseia-se na harmonia cósmica. Os homens só são considerados como tal se viverem em comunidade. O foco central dos clássicos é o Estado, enquanto que a teoria política moderna tem como foco central o homem.

Tendo estas premissas em vista é que Platão escreve seus textos. Na “República”, Platão busca a criação de um Estado ideal tendo como base um novo conceito tanto de justiça quanto de educação.

Para Platão, o cidadão deve ter, como ponto central da sua vida, o Estado. É por este motivo que o autor sustenta, por exemplo, a supressão da família, pois assim a criança “canalizaria” suas ações em favor do Estado, ou seja, o indivíduo privilegiaria sempre o Estado, relegando até mesmo seus entes queridos.

O Estado ideal platônico tem por base a justiça. Desta forma, os homens deveriam se especializar nas atividades que desempenham melhor. Isto é necessário porque, a partir do momento em que o indivíduo conhece o seu “campo de ação”, ele se atém ao mesmo, sem invadir o espaço dos outros e, conseqüentemente, sem criar problemas aos outros.

As três “classes” propostas na “República” são: a classe dos governantes, a classe dos militares (guerreiros) e a classe dos produtores (agricultores). É importante notar que, para Platão, a harmonia ocorre neste ordenamento quando a classe dos governantes e dos militares não têm de se preocupar com sua subsistência. Isto é importante para o bom funcionamento do Estado como um todo.

A visão política clássica aposta na virtude dos homens. Isto fica claro quando vemos Platão condenar o “sistema eleitoral” da época, onde os governantes eram escolhidos por sorteio. Platão diz que tal sistema é duplamente injusto, primeiro porque o governante sorteado pode não ser bom, ou seja, é uma injustiça para com a população, e segundo porque o mau governante estaria ocupando o lugar de uma pessoa mais bem qualificada para o cargo.

Mas não é só na virtude que o Estado platônico está baseado. A ambição humana tem de ser reprimida. Platão oferece alternativas para a possível corrupção do governo, onde o governante utilizar-se-ia de seu cargo para conseguir “despojos”. É interessante notar que tal apropriação de benefícios em decorrência do cargo ocupado não ocorre somente na oligarquia, mas também na democracia. E é por isto que Platão defende a especialização das funções: sem precisar se preocupar com sua subsistência, o governante utilizaria toda a sua energia no comando do Estado.

Outro aspecto importante a ressaltar é que o rei deveria ser, também, filósofo. Platão achava muito importante que os reis tivessem conhecimento não só da arte de governar, mas que também conhecessem outros aspectos que tornariam seus reinados melhores.

Estas são as principais características do modo clássico de pensar a política. Fica evidente uma certa dependência a fatores “externos”, ou seja, há a crença em fatores “místicos”, como não poderia deixar de ser naquela época. Contudo, vê-se um início de racionalização das idéias, onde a busca por um Estado melhor -- seja através da criação do Estado ideal, como queria Platão, seja através do melhoramento das condições atuais do indivíduo, como queria Aristóteles -- era o objetivo final.


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