3 de setembro de 2007

Formação do estado no Brasil (I)

Refletindo determinado momento acadêmico meu, continuo com as postagens sobre o processo de formação do estado no Brasil. Hoje vou colocar um trabalho que fiz durante o mestrado falando sobre o tema, ou seja, como se formou a estrutura estatal brasileira levando-se em consideração a situação política, econômica, cultural e social da colônia. Como este trabalho é grande, irei dividi-lo em várias postagens, sendo que cada uma delas vai ser postada em dias diferentes. Abaixo, a primeira parte.

Introdução

O objetivo deste trabalho é fazer considerações acerca do surgimento do sentimento de nação no Brasil e como tal sentimento ajudou a formar e/ou influenciou a formação de uma nova ordem social competitiva no nosso país.

Para tanto, a primeira caracterização que temos de fazer é acerca do próprio conceito de nação. Segundo BOBBIO (1998, 796),

Normalmente a Nação é concebida como um grupo de pessoas unidas por laços naturais e portanto eternos (...) e que, por causa destes laços, se torna a base necessária para a organização do poder sob a forma do Estado nacional. As dificuldades se apresentam quando se busca definir a natureza destes laços, ou, pelo menos, identificar critérios que permitam delimitar as diversas individualidades nacionais, independentemente da natureza dos laços que as determinam.

Ou seja, se por um lado a definição de Bobbio citada acima define razoavelmente o conceito de nação, por outro a própria definição já traz problemas, ao não deixar claro quais laços naturais unem os indivíduos em um determinado território. Para diminuir tais dúvidas, Bobbio explicará que o conceito de nação tem um caráter fortemente ideológico, que pode ser usado pelo Estado para forjar um sentimento de união em torno de uma “causa comum”, de acordo com as circunstâncias. Assim, “(...) antes da Primeira Guerra Mundial, Trento e Trieste eram italianas porque seus habitantes eram de língua italiana, enquanto a partir do término da Primeira Guerra Mundial, o Tirol do Sul é italiano porque se acha situado dentro dos ‘limites naturais’ da Itália.” (BOBBIO 1998, 797-8).

O que Bobbio chama de “ideologia nacional” seria a união da evolução do sistema de produção, provocada pela Revolução Industrial – que criou mercados de dimensões “nacionais”, ampliou cada vez mais os horizontes da vida cotidiana das diversas camadas da população e uniu à entidade Estado diversos comportamentos econômicos, administrativos, políticos e jurídicos – com comportamentos que constituem o sentimento íntimo da personalidade e da afinidade básica do grupo (BOBBIO 1998, 798).

Falar do sentimento de nação dentro do contexto histórico europeu é relativamente fácil. Percebemos, pela evolução histórica das sociedades européias, que esse sentimento de nação, esses “laços naturais” correspondentes a comportamentos comuns por parte de indivíduos de um determinado território, surge antes da centralização do poder político em apenas um soberano, com a conseqüente criação do Estado. Pode-se afirmar que é a nação, na Europa, que cria o Estado, já que, antes mesmo da centralização política e administrativa, os indivíduos passaram a se identificar com um quadro de comportamentos que está relacionado às “entidades” França, Alemanha, Espanha, etc., que foram oficialmente dados como Estados nacionais apenas posteriormente.

No caso do Brasil, essa delimitação do sentimento de nação já não é tão fácil nem aparente. Durante o período colonial não havia, dentre os diversos estamentos que compunham a sociedade da colônia – senhores, escravos, indígenas, vadios, agregados, etc. – os “laços naturais” citados anteriormente. Cada estamento, por mais dependente que fosse dos outros, tinha suas próprias formas de vida, não havendo laços comuns que unissem tais estamentos em torno de um sentimento eminentemente nacional, como ocorrido na Europa. Não havia uma sociedade que se regulasse por um quadro de comportamentos comuns: cada estamento tinha suas próprias características, que não se relacionavam com as características dos demais estamentos. Além disso, o sentimento nacional típico da maioria da população livre – ou seja, os senhores de engenho – não era o de se considerarem brasileiros, e sim portugueses, que estavam apenas aproveitando uma oportunidade de enriquecimento na colônia, objetivando retornar o mais rapidamente possível para a metrópole.

Referências bibliográficas:

BOBBIO, Norberto. Dicionário de política. Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino. 11ª Ed. 2 vol. Brasília: Ed. UnB, 1998.

CARVALHO, José Murilo de. A construção da ordem: a elite política imperial. Brasília: Ed. UnB, 1981.

FERNANDES, Florestan. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.

FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. 19ª Ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1984.

HISTORIANET. O processo de independência do Brasil. Disponível em: http://www.historianet.com.br/main/conteudos.asp?conteudo=3. Acessado dia 14 de janeiro de 2003.

PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo. 22ª Ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1982.


2 comentários:

Káh disse...

Eita mas assim vou ter que visitar aqui todos os dias. "Que chato" :P

Ah, vou começar a ler "Era das revoluções" amanhã (sexta) e quero terminar até sábado. Depois conversamos sobre o livro e suas postagens.

Tenha um maravilhoso feriadão e se cuida!

Beijos ;)

Flávio de Campos Barbosa disse...

Boa tarde professor, o blog está na ativa ainda, é um ótimo espaço para conhecer melhor a história do Brasil e principalmente para nós Historiadores...parabéns pelo espaço.