2 de novembro de 2007

"O estado e a revolução"

Vladímir Ilitch Lenin (nome original: Vladímir Ilitch Uliânov), nascido em 10 de abril/22 de abril de 1870 em Simbirsk (hoje Ulyanovsk) e falecido em 21 de janeiro de 1924 em Gorki, próximo de Moscou, foi um revolucionário russo responsável, em grande parte, pela concretização da Revolução Russa de 1917. Foi líder do Partido Comunista e primeiro presidente do Conselho dos Comissários do Povo da União Soviética. Influenciou teoricamente os partidos comunistas de todo o mundo. As suas contribuições resultaram na criação de uma corrente teórica denominada Leninismo. Foi, para o historiador Eric Hobsbawm, o personagem mais influente do século XX. O seu pseudónimo de "Lenin" provém de que foi exilado para uma terra das margens do Rio Lena, ou seja, provém do nome desse rio (WIKIPÉDIA, 2007a).

O estado e a revolução (o que ensina o marxismo sobre o Estado e o papel do proletariado na revolução) é um livro de Lênin publicado em setembro de 1917, às vésperas da Revolução de Outubro liderada pelo partido bolchevique.

No livro, Lênin discute a teoria marxista em diálogo com os anaquistas e especialmente aqueles a que chama de oportunistas, os pensadores e partidos socialistas que tendiam a uma interpretação de evolução gradual do capitalismo ao socialismo defendendo os meios parlamentares como legítimos -- quando não únicos -- para a luta do proletariado frente aos capitalistas (WIKIPÉDIA, 2007b).

Lênin escreve O estado e a revolução em agosto-setembro de 1917, no auge da crise política que culminou na Revolução de Outubro. Baseado em experiências históricas -- as revoluções de 1848-1851 na Europa, nomeadamente na França, e na Comuna de Paris de 1871 --, Lênin faz uma explanação pormenorizada da doutrina de Marx e Engels sobre o estado, e mostra como esta teoria poderia ser aplicada na prática -- no caso, na prática do momento histórico em que vivia na Rússia czarista do início do século XX, no meio da Primeira Guerra Mundial.

Em primeiro lugar, Lênin vai definir o que é o estado, o aparelho do estado, a máquina do estado. Aqui, baseia-se primariamente em Engels: o estado é a força que "gerencia" a sociedade, que modera e legaliza o conflito de classes, que evita que as diferentes classes sociais se destruam mutuamente, e este estado se utiliza de seus meios de coerção para manter a ordem e reprimir as classes dominadas e exploradas. A ordem criada por este estado consiste, por um lado, em remover das classes dominadas e exploradas os meios que lhes permitiriam derrubar seus opressores e, por outro lado, em acumular, nas mãos destes opressores, os meios de impor e manter sua vontade de classe. O estado, para Lênin, surge apenas em conseqüência da impossibilidade de se conciliar os interesses das diferentes classes que compõem a sociedade (CHEVALLIER, 1998, p. 376).

A essência do estado, para Lênin, reside em seus aparelhos coercitivos e repressivos, notadamente o exército permanente e a polícia. É por isso que, para ele, seria impossível substituir o estado burguês pelo estado proletário sem uma revolução violenta. Dever-se-ia proceder com a destruição completa da velha máquina estatal, já que nenhuma forma e/ou instituição do "velho" aparelho de estado poderia ser reformada. Outra peça fundamental do estado coercitivo e benfeitor das classes burguesas é a burocracia.

Tendo em vista esta situação de "exploração institucionalizada" de uma classe social em relação à outra, é tarefa intrínseca ao proletariado realizar a revolução de forma violenta. O proletariado deve se apoderar desta "máquina burocrática" apenas por meio da força -- já que a "república democrática" definida por Engels "é o melhor invólucro político de que se pode revestir o capitalismo". A república democrática, com possibilidade de participação das massas, nada mais é do que um engodo para o proletariado, que continuaria sendo explorado do mesmo jeito -- ou até mais, com a ampliação da área de atuação do estado. As massas operárias e camponesas devem estar conscientes de que só atingirão o poder por meio de uma revolução violenta.

Após se apoderar da máquina estatal, o proletariado transforma-se em classe dominante; estabelece-se a ditadura do proletariado, período transitório, temporário, que levará à completa eliminação do estado: não apenas do estado burguês, que legitima a exploração, mas a eliminação de todo e qualquer estado. Porém, em um primeiro momento, a destruição do estado burguês e a criação de um estado proletário são tarefas necessárias para a transformação de todos os meios de produção, que seriam anteriormente privados, ou seja, que estariam nas mãos dos capitalistas, em meios de produção coletivos, do estado.

Além disso, a presença de um estado proletário, que se utiliza provisoriamente de instrumentos de coerção, é necessária não apenas para expropriar dos capitalistas os meios de produção, mas também -- e principalmente -- para a própria supressão do caráter de classe existente na sociedade atual. Ainda, a força do estado é necessária para se evitar a contra-revolução e a retomada do poder por parte dos capitalistas, ou seja, para se reprimir os adversários da revolta proletária.

Durante a ditadura do proletariado, deverá ser exercido um controle extremamente rigoroso sobre a produção e a distribuição dos bens, sobre a medida de trabalho e sobre a medida de consumo entre os indivíduos que compõem a sociedade. Isto é necessário para se passar da fase de distribuição dos bens segundo seu trabalho -- ou socialismo -- para a fase da distribuição dos bens segundo a necessidade – ou comunismo (CHEVALLIER, 1998, ´; 379).

Um aspecto que Lênin destaca e dá importância é em relação à participação de todos no período posterior à tomada do poder pelos proletários:

Quanto mais completa a democracia, mais próximo está o momento em que se tornará supérflua [a necessidade de existência de um aparelho estatal]. Quanto mais democrático é o estado constituído pelos operários armados, estado que deixou de ser um estado no sentido próprio da palavra, mais rapidamente começa a deperecer todo o Estado. (...) A necessidade de observar as regras simples e essenciais de toda sociedade humana "logo se tornará um hábito". (...) O hábito, o costume trarão certamente a obediência "sem violência, sem constrangimento, sem submissão, sem o aparelho especial de coerção que se chama: Estado" (CHEVALLIER, 1998, p. 386. Grifos no original).

Lênin tinha um projeto para a revolução que se baseava na existência de um partido submetido a uma disciplina férrea que conduziria as massas trabalhadoras a uma inevitável vitória sobre o absolutismo czarista. O desenvolvimento de sua teoria segue as seguintes características: Lênin argumentava que, com as pressões externas, imperialistas, o estado oprimiria ainda mais a classe operária, pois o imperialismo exige que exista um número cada vez maior de mercadorias para serem vendidas em outros mercados consumidores. No sistema capitalista, para que as classes não se exterminem mutuamente, é necessária a existência de um "mecanismo de proteção", e tal mecanismo é o estado. Contudo, o estado "gerencia" as lutas de classe legalizando-as, e não acabando com elas. O estado passa a usar sua força para oprimir os trabalhadores, por um lado, e para acumular os meios de impor e manter sua vontade de classe, por outro.

Para destruir o estado, o proletariado deve apoderar-se da máquina estatal de maneira violenta. Após esta fase, o proletariado, agora classe dominante, estabelece a sua ditadura. É por meio dela que haverá a transformação dos meios de produção em propriedade do estado. Os proletários usarão a máquina estatal provisoriamente, apenas para acabar com as disputas de classe. Após atingir este objetivo, o proletariado deve destruir o estado, ao contrário das outras revoluções, que aperfeiçoaram-no. Esta destruição estatal é feita de maneira gradual; o estado, por si só, iria desaparecendo, ao mesmo tempo em que seus instrumentos deixassem de ser usados. O desaparecimento do estado ocorre também porque as regras do sistema comunista tornam-se um hábito, sem a necessidade do papel coercitivo do estado para obrigar os cidadãos a fazerem determinada coisa ou agirem de determinada maneira. Esta seria a fase "superior" do comunismo.

Lênin, de fato, via a transição ao socialismo como tarefa do Comitê Central de um Partido Comunista de vanguarda, que guiaria os trabalhadores em direção ao comunismo, em vez de contar com eles para prover a dinâmica da transformação social.

Lênin acreditava que a consciência deveria ser levada à classe trabalhadora a partir de fora e, para ele, a agência que o realizaria não era a intelectualidade tradicional, mas o próprio partido revolucionário, um partido no qual os ex-trabalhadores e os ex-intelectuais profissionais de descendência burguesa se fundiram em uma unidade coesa. Deixada aos seus próprios recursos, escrevia Lênin, a classe trabalhadora é incapaz de desenvolver qualquer concepção da missão histórica que Marx lhe atribuía. "O desenvolvimento espontâneo do movimento dos trabalhadores conduz precisamente a sua subordinação à ideologia burguesa... (e à) escravização ideológica dos trabalhadores pela burguesia". Lênin defendia que tal "partido de novo tipo" necessitava de uma organização de novo tipo. Ele devia ser organizado e centralizado como um exército, com todo o poder e autoridade residindo em seu Comitê Central (CARNOY, 1988, p. 87).

Ou seja: ainda que defendesse a participação das massas no processo revolucionário, estas, na verdade, participariam como massa de manobra em tal processo, já que a função de "guia" da revolução seria feita pelo partido de vanguarda, pelo partido comandado por aqueles que efetivamente tivessem consciência de seu papel revolucionário, já que as massas, por não terem ainda a consciência necessária sobre esta função na revolução, acabariam sendo cooptadas pela burguesia e, assim, causariam a derrocada do processo revolucionário.

Lênin, desta forma, sugere explicitamente a formação e consolidação de uma elite política, a elite dos que têm consciência de classe e que podem guiar o processo revolucionário. No entanto, esta elite política não seria eleita, como pretendia Schumpeter posteriormente, mas seria criada e consolidada tendo por base o critério de "bons serviços para a revolução", ou ainda a "grande consciência do processo revolucionário". Desta forma, as massas, ou a sociedade como um todo, tanto para Lênin quanto para Schumpeter, seriam guiadas por uma pequena elite, por um pequeno grupo que efetivamente se interessaria pela política -- seja de forma revolucionária, seja de forma democrática.

Vale destacar, entretanto, que o centralismo defendido por Lênin se referia apenas ao processo da revolução, ou seja, o partido de vanguarda, a "elite revolucionária", agiria como tal apenas durante a revolução. Após a extinção do estado, todos na sociedade teriam o direito -- e até mesmo o dever -- de participar democraticamente da definição dos rumos que esta nova sociedade -- sem poder coercitivo, sem estado, sem classes -- seguiria.

Referências bibliográficas:

CARNOY, Martin. Estado e teoria política. 2ª Ed. Campinas: Papirus, 1988.

CHEVALLIER, Jean-Jacques. As grandes obras políticas de Maquiavel a nossos dias. 8ª Ed. Rio de Janeiro: Agir, 1998.

WIKIPÉDIA. Desenvolvido pela Wikimedia Foundation. Apresenta conteúdo enciclopédico. Disponível em: . Acesso em: 2 Nov 2007a.

WIKIPÉDIA. Desenvolvido pela Wikimedia Foundation. Apresenta conteúdo enciclopédico. Disponível em: . Acesso em: 2 Nov 2007b.


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