31 de março de 2008

Ciência e política, duas vocações (I)

Max Weber propõe-se a discutir sobre a vocação para a política através do Estado. Este Estado é definido através do seu meio de existência, que é a coação física. Caso a violência não estivesse presente, não existiria também o Estado. O Estado, portanto, é a única fonte do "direito" à violência. A política será então o conjunto de esforços visando à participação do poder ou à influência na divisão desse poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado.

Contudo, apesar de o Estado basear-se na violência, ele é, antes de tudo, uma relação de dominação de um homem sobre outro homem. Esta dominação é legitimada através de três idéias puras: a primeira é a que diz que um homem admite ser dominado por outro devido à tradição e aos costumes; a segunda baseia-se no carisma do dominador, ou seja, em características especiais como devoção e confiança nesta pessoa; por fim, a terceira idéia de legitimidade é fundada na idéia de crença na validez de um estatuto legal (uma eleição, por exemplo).

Dentre estas três idéias, a que mais serve-nos para explicar a vocação para a política é a segunda. É o carisma interior de um chefe ou profeta que faz com que outros homens sigam-no não por obediência ou por costume, mas pela fé. E, caso este líder esteja realmente comprometido, irá viver para seu trabalho e realizará uma grande obra. Contudo, não é apenas este homem que define o processo político: antes, é necessário verificar a natureza dos meios de ação destes homens políticos.

A dominação, seja ela tradicionalista, carismática ou legalista, depende de um estado-maior administrativo -- que irá garantir que as atividades desenvolvidas pelos dominados estejam de acordo com a vontade do dominador -- e também dos meios materiais de gestão. Este estado-maior administrativo, todavia, não irá obedecer ao chefe apenas pelas questões de legitimidade acima citadas. Antes de tudo, interesses pessoais influenciam esta dominação: retribuição material e prestígio social. Desta forma, o salário e a dignidade dos servidores são bons exemplos para os dois tipos de recompensa esperada, e o temor de perder estas recompensas é o que liga o estado-maior administrativo aos detentores do poder.

O estado-maior administrativo divide-se em duas categorias: na primeira, o próprio estado-maior é possuidor dos instrumentos de gestão, ou seja, possuem edifícios, recursos financeiros, material de guerra. A segunda é exatamente o oposto: o estado-maior é privado dos meios de gestão. Por isto, sempre é importante determinar se o detentor do poder dirige e organiza a administração ou se a administração está nas mãos de pessoas economicamente independentes do poder.

Chama-se de agrupamento organizado "segundo o princípio das ordens" o agrupamento político nos quais os meios materiais de gestão são, total ou parcialmente, propriedade do estado-maior administrativo. Isto implica dizer que o soberano exerce seu poder através da dependência dos súditos e do uso da coação exercida pelo exército que ele comanda. Por isto, nota-se que o Estado moderno conseguiu privar os funcionários e trabalhadores de quaisquer meios de gestão. Isto significa dizer que o Estado é um agrupamento de dominação de caráter institucional que monopoliza, no seu território, o uso legítimo da violência física como instrumento de domínio e que reúne, nas mãos do seu dirigente, os meios materiais de gestão.

Ao longo deste processo de monopólio empreendido pelo Estado moderno, surgiu uma nova categoria: a dos "políticos profissionais". Eram pessoas dispostas não a ser senhores, mas sim influenciar estes mesmos senhores. Colocavam-se à disposição dos príncipes dando conselhos e recebiam em troca o seu ganha-pão, além de conteúdo moral para suas vidas. É a partir daqui que poderemos definir o que é viver "da" política e viver "para" a política.

Em geral faz-se as duas coisas: vive-se da e para a política. Quem vive "para" a política transforma-a em fim de sua vida, ou seja, trabalha para a política seja porque gosta do poder, seja porque encontra um equilíbrio pessoal em favor de uma "causa" que dá significado à sua vida. Contudo, a diferença principal é o aspecto econômico. Supõe-se que quem vive para a política já está estabilizado financeiramente, não dependendo da remuneração pelas suas atividades políticas. Desta forma, um capitalista é um grande candidato a homem político, pois já tem seu sustento garantido pela sua atuação econômica. Isto implica dizer que aquele que depende da remuneração pelos seus trabalhos vive da política e aquele que não depende vive para a política. Por isto, ou a atividade política é feita de maneira "honorífica", e neste caso só pode ser feita por pessoas economicamente independentes, ou é aberta a pessoas sem fortuna, exigindo neste caso remuneração.

Esta remuneração, em nossos dias, transformou-se em empregos de toda espécie, seja em partidos, em jornais ou na administração do Estado -- e estes empregos são distribuídos pelos chefes de partido a seus partidários. Isto explica o por quê de as lutas partidárias não serem lutas apenas para execução de metas objetivas, e sim rivalidades para controlar a distribuição de empregos. E atualmente as próprias pessoas comuns ajudam a aumentar esta rivalidade, pois querem garantir seu futuro através de empregos estáveis distribuídos por estes partidos.

(Continua na próxima postagem.)


Um comentário:

Ricardo Riffert disse...

Obrigado pela contribuição.