9 de junho de 2008

Estabilidade política (VI)

(Continuação da postagem anterior.)

LEGADO DE O ESPÍRITO DAS LEIS E DE O FEDERALISTA

O legado que ambos os textos deixam para nós é incrível. Mesmo levando-se em consideração o fato de que a receita de Montesquieu não funcionou por muito tempo, sendo a monarquia substituída pela república na França após a Revolução Francesa, vemos que a teoria de separação dos poderes, que foi primeiro formulada por Montesquieu, é a base do Estado até hoje. Em quase todos os países vemos o poder executivo separado do legislativo e estes do judiciário. A estabilidade política representada por tal separação é inquestionável.

Contudo, é em O Federalista que, a meu ver, estão as maiores contribuições para o Estado contemporâneo. Mesmo levando-se em consideração que o modelo republicano-presidencialista só deu certo nos Estados Unidos -- não há outro país republicano-presidencialista no mundo de igual sucesso aos EUA -- os mecanismos encontrados por Hamilton, Madison e Jay para defender a república são mais sensatos e inteligentes do que os mecanismos utilizados por Montesquieu para defender a monarquia. Isto, contudo, não invalida os estudos de Montesquieu.

O mecanismo de controle de facções apresentado por O Federalista é justamente um dos pontos criticados por Montesquieu, qual seja, o de que a república só deve ser utilizada em países pequenos. O argumento de O Federalista é não apenas uma resposta a Montesquieu, mas algo que foi utilizado na prática e que deu certo, pelo menos no início dos Estados Unidos como país independente, fase em que todo cuidado era necessário.

Outro aspecto que garante a estabilidade política -- ou pelo menos deveria garantir -- é o fato de que a lei deve ter força e ser cumprida, aspecto que também era criticado pelos três autores norte-americanos. Não adianta nada as leis serem criadas e não serem cumpridas.

Por último, vale notar que O Federalista é um dos primeiros documentos que oficializam a tendência liberal dos governos. Este liberalismo, contudo, não é apenas como conhecemos hoje -- o liberalismo econômico --, mas também, e principalmente, dizia respeito ao liberalismo político e social, no sentido de que as pessoas deveriam ser livres para agir e pensar da maneira que quisessem. Tal liberdade, de certa forma, era tolhida pela monarquia, se considerarmos que neste regime as ordens vinham dos reis e, caso não fossem arbitrárias, deveriam ser cumpridas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHEVALLIER, Jean-Jacques. As grandes obras políticas de Maquiavel a nossos dias. Trad. Lydia Cristina. 8ª ed. Rio de Janeiro, Agir, 1998.

MADISON, James. Os artigos federalistas: 1787-1788: edição integral. James Madison, Alexander Hamilton, John Jay. Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1993.

MONTESQUIEU. De l’esprit des lois. Trad. Lólio Lourenço de Oliveira. Paris, Éditions Garnier Frères, 1973. T. I, p. 9-19.

TOCQUEVILLE, Alexis de. A democracia na América. Trad. Neil Ribeiro da Silva. 2ª ed., Belo Horizonte, Ed. Itatiaia; São Paulo, Ed. da Universidade de São Paulo, 1977.

WEFFORT, Francisco C. (org.) Os clássicos da política -- volume um. 7ª ed. São Paulo, Ática, 1998.

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