15 de dezembro de 2008

Férias

Prezados visitantes,

A partir de hoje este blog encontrar-se-á em "férias". Com a aproximação do fim do ano, torna-se impossível para mim publicar textos com a mesma freqüência de antes. E é claro, eu preciso de umas férias.

Isso não significa, contudo, que novos textos não serão postados aqui. Eventualmente alguma coisa poderá aparecer, mas sem a regularidade anterior (um dia sim, um dia não).

Deixarei o blog de férias oficialmente até dia 10 de fevereiro de 2009, quando planejo voltar com as postagens constantes.

Em caso de dúvidas, por favor entrem em contato.

Cordialmente,

Prof. Matheus.

12 de dezembro de 2008

Humanismo e Política (II)

A Europa não é mais uma região organizada hierarquicamente, como na Idade Média. Os homens passam a organizar-se em Estados, os quais não são governados pelo Papa, e sim por indivíduos que se manifestam na política. Os Estados não são mais pequenos Estados, e sim países com grande extensão territorial.

O rei passa a ser o soberano supremo do Estado, baseando-se no regime da monarquia absolutista. É interessante notar que o rei torna-se uma espécie de “senhor feudal”, tendo por base os “vassalos”, que eram os antigos senhores feudais propriamente ditos. Vale destacar ainda a influência do patriotismo na consolidação dos Estados nacionais.

O Estado absolutista é um estado guerreiro, no sentido de que iniciam-se diversas guerras entre os recém formados Estados tendo em vista a conquista de novos territórios, além das disputas econômicas e políticas. Mesmo sendo uma unidade territorial, a monarquia absolutista é marcada por diversos particularismos, tendo cada ordem, cada instituição uma certa autonomia própria; e é baseando-se nestas disputas internas que o rei governa. Além disto, há ainda uma certa disputa entre as diversas famílias feudais, que anseiam por manter seu domínio dentro do seu território.

Outra luta importante a se destacar é a que ocorreu entre burguesia e nobreza. Neste caso, o fiel da balança é o rei, pois o mesmo precisa tanto de uma quanto da outra. A burguesia necessita do rei para poder obter concessões comerciais de monopólios, hipotecas dos domínios reais, proteção contra as leis da Igreja contra a usura e contra os entraves senhoriais ao comércio. Por outro lado, o rei necessita do dinheiro trazido pela burguesia, para poder financiar seu exército permanente, além de a burguesia ser uma aliada contra a nobreza.

Entretanto, o rei também precisava da nobreza, pois era esta quem realmente tinha contato com a população. Além disto, a nobreza não poderia “lutar” diretamente contra a burguesia sem o apoio do rei. Vale lembrar ainda que a nobreza considerava apenas os seus afazeres realmente nobres, e passam a utilizar estes atributos para diferenciarem-se da burguesia. O nobre passa a solicitar cargos políticos, como o governo de uma província ou de uma companhia.

A monarquia que mais se destacou no período absolutista foi a francesa. O poder do rei é reconhecido de direito; sua soberania é um legado divino; o rei é responsável apenas perante Deus; detém todos os poderes, pode declarar guerras e fazer a paz; pode lançar impostos a seu bel-prazer, pode legislar e julgar. Sua única obrigação é respeitar os contratos e os costumes, além de dever defender a Igreja contra a heresia.

É importante notar que a Igreja está abaixo do poder do rei: os bispos e padres são “vassalos” do mesmo. Os senhores feudais também estão abaixo do rei: no reino só existem vassalos. O rei implanta a política econômica do mercantilismo, tendo em vista a acumulação de metais preciosos.

Entretanto, mesmo com este poder absolutista, o rei acaba não mandando sempre, devido às enormes distâncias e à péssima qualidade de comunicação. Como conseqüência, as instituições locais conservam muito da iniciativa dentro de suas províncias.

Vale ainda destacar o peso das guerras religiosas no sentido de desenvolver ainda mais o absolutismo, pois os indivíduos perseguidos exilavam-se em outros Estados, fazendo com que o governo francês regulasse cada vez mais a vida industrial, política e econômica do Estado.

10 de dezembro de 2008

Humanismo e Política (I)

O Humanismo, também chamado de Renascença, é a “ideologia” típica da Idade Moderna. É um movimento cultural que busca, em um primeiro momento, resgatar e imitar os conhecimentos da cultura greco-romana e, posteriormente, criar suas próprias obras tendo como base o homem, que passa a ser o centro da atenção humana. É importante ressaltar que os artistas desta época buscavam, nos antigos, um estímulo à sua própria imaginação, e não um modelo a ser copiado. O movimento surgiu na Itália e, de lá, propagou-se aos outros países.

O que mais se destaca na Renascença é a abundância de gênios e talentos extraordinários. Mesmo não havendo pensadores como Aristóteles e Platão, outros campos da cultura, como a arte, a música e a literatura, destacam-se profundamente.

Este movimento pode ser explicado como uma conseqüência do feudalismo. O homem percebe que ocupa um lugar no mundo, e passa a “coloniza-lo” efetivamente obviamente, as atenções são todas para o próprio homem: ele quer provar que é capaz de realizar o que quiser.

A anatomia humana é a primeira área beneficiada pela Renascença. Pintores chegam a dissecar cadáveres para conhecer com exatidão o interior do corpo humano. E o objetivo não é só exaltar o homem: é necessário educa-lo também.

A religião não é esquecida: apenas o seu foco muda. O homem passa a ser visto como um microcosmo, como um ser feito por Deus mas que precisa se preocupar também com o seu habitat material. O homem pode modificar, melhorar, recriar o local onde vive. O homem tem o livre-arbítrio para escolher entre as coisas inferiores, degenerando-se, ou as superiores, regenerando-se.

O que marca a Renascença é a experimentação, ou seja, o homem não mais acredita nas coisas por questões teológicas ou filosóficas, e sim por experiência própria. E o homem utilizará esta experiência em proveito próprio, vendo como a natureza funciona para poder manipula-la. É o embrião da ciência.

Um dos grandes nomes do período renascentista, talvez até mesmo o maior nome, é Leonardo da Vinci. Ele dizia que o homem, para poder criar obras que sejam entendidas e que produzam os sentimentos originais do autor, o mesmo deve “transformar-se na própria natureza”. O artista deve ser também cientista e filósofo.

Há quem afirme que a Renascença é eminentemente pagã e anticristã. Contudo, quando os renascentistas dizem que vão à busca do antigo, eles não estão renegando a ideologia cristã, pois os renascentistas baseiam-se nos antigos para legitimar sua própria fé. Outro aspecto renascentista, o da criação do novo, também não é anticristão, pois o espírito renascentista é a própria manifestação do poder e da bondade de Deus. Os próprios artistas tinham consciência de que eles eram a manifestação de Deus. Por fim, a valorização do homem, também característica da Renascença, não tem nada de anticristão. Pelo contrário, é a exaltação do homem como criatura feita por Deus, e à Sua imagem e semelhança. O homem se engrandece com a beleza, a inteligência e o gênio, mas só atinge a perfeição através de Deus.

O problema da Renascença é que ela supervalorizou o homem de maneira unilateral, fazendo-o achar que criou Deus, e não que foi criado por Ele. Esta mentalidade levou ao antropocentrismo absoluto, isto é, ao ateísmo.

Dois humanistas não-italianos merecem destaque. Erasmo de Roterdam e Thomas Morus. O primeiro tornou-se monge porque era nos mosteiros que o movimento humanista iniciou-se. Contudo, não se sentiu à vontade com a vida ascética, e por isto saiu do convento.

Atingiu o sucesso com o livro Elogio da Loucura, no qual satirizou tudo e todos: homens, instituições e costumes. Erasmo, contudo, generalizou demais, e não levou em conta as honrosas exceções. Suas críticas, contudo, são boas, pois compara as atitudes dos papas e bispos com as de Jesus. Tem um estilo bastante racionalista e crítico.

Procurou revelar as fontes originais e puras da Igreja, através da tradução do original grego do Novo Testamento e da reedição de livros dos santos padres. Buscou também reconciliar Lutero e o papa, mas sua tentativa foi frustrada. Foi repudiado tanto pelos reformistas quanto pelos católicos, e morreu sem ter suas idéias de paz e conciliação postas em prática.

O segundo humanista foi o inglês Thomas Morus. Foi um humanista cristão e, por isto, reprovou o divórcio do rei Henrique VIII, além de não o reconhecer como chefe da Igreja Anglicana.

A grande diferença entre Erasmo e Morus é que este faz uma crítica muito mais moderada e, principalmente, respeitosa à Igreja Católica. Tais críticas e idéias foram expostas em seu livro intitulado Utopia.

Neste livro, Morus expõe como corrigir os males e desajustes da sociedade, dos quais derivam a tirania e a corrupção política, além do abuso da propriedade privada no campo econômico. Ele propõe a reformulação do direito de propriedade e a reorganização das relações econômicas.

Mesmo com esta “explosão” renascentista, alguns itens ficaram a desejar. O uso do latim na grande maioria dos escritos, por exemplo, colocou em segundo plano as línguas nacionais. Além disto, a Renascença não atingiu as classes pobres e incultas, nem como mentalidade, nem como transformação.

Entretanto, mesmo levando-se em consideração tais falhas, pode-se dizer que a Renascença foi o início da sociedade atual. A valorização do homem, o desenvolvimento científico e tecnológico e o próprio conhecimento atual das civilizações antigas são conseqüências da Renascença.

8 de dezembro de 2008

A Inquisição no Brasil (II)

A Inquisição não foi oficialmente instalada no Brasil. Ainda que houvesse padres, bispos e “inquisidores” com poder legítimo de fazer buscas por hereges, não foi instalado nenhum Tribunal do Santo Ofício na colônia. O papel destes bispos e “inquisidores” era o de localizar os possíveis hereges, prende-los e envia-los a Portugal, para serem lá julgados pela Inquisição portuguesa.

Ao final do século XVI, a Inquisição aumentou sua atuação na colônia, ainda que não houvesse nenhum Tribunal por aqui. Os “inquisidores” tinham por objetivo verificar qual o tipo de fé existente na colônia, além do interesse de integrar o Brasil no mundo cristão, ou seja, expandir o catolicismo. Entretanto, tal aumento da atuação deve-se, provavelmente, à cobiça dos Filipes, pois eles sabiam que vários comerciantes e senhores de engenho eram de origem judaica.

O visitador Heitor Furtado, que veio à colônia, agiu como esperado de um inquisidor: afixou o Edital da Fé em todas as portas das igrejas, apregoou o monitório e anunciou o tempo da Graça. O objetivo era manter o domínio da Igreja nas relações sociais. Já no século XVII, as visitações praticamente acabaram, mas nem por isto o Santo Ofício diminuiu suas atividades na colônia. A igreja aperfeiçoou a máquina inquisitorial e organizou a estrutura judiciária que dava suporte àquela máquina inquisitorial.

A “Inquisição” da colônia agia mais no sentido de identificar possíveis “criminosos” e de dar meios para que estes se arrependessem dos seus erros. Apenas após a terceira ou quarta vez em que fossem pegos é que eles seriam enviados ao Tribunal do Santo Ofício em Lisboa. No início, o papel dos jesuítas foi fundamental, no sentido de se arranjarem culpados para a Inquisição. Contudo, após disputas pelo poder no interior da Igreja portuguesa, a Companhia de Jesus e a Inquisição romperam, passando a trabalhar uma contra a outra na metrópole. Na colônia, jesuítas e inquisidores andaram de mãos dadas, um ajudando o outro.

O principal fator do relativo êxito da Inquisição colonial era o medo dos habitantes. Os relatos vindos da América espanhola, além do vai-e-vem de hereges entre Salvador e Lisboa, o pavor da morte na fogueira, do confisco dos bens e da infâmia fizeram com que os habitantes tivessem um verdadeiro pânico em relação ao inquisidor. E foi este pânico que garantiu o êxito da Inquisição em um vasto território, além de outras dificuldades, como o transporte. Em virtude do medo, a própria população delatava atos considerados pecado pela Inquisição, traindo desta forma amizades, amores, paixões e até mesmo laços de famílias.

Grandes aliados do Santo Ofício foram a ruína das solidariedades locais – com muito mais acusados do que acusadores –, o afloramento de preconceitos e o reavivar de rancores. Estes três aspectos da nascente sociedade colonial contribuíram – e muito – para o êxito dos visitadores, que davam o perdão dentro do período da graça – tempo no qual aqueles que se confessassem seriam perdoados.

Além de acusações de cunho material – como por exemplo apostas não pagas, rixas de vizinhos, as quais não eram levadas em conta pela Inquisição –, outras acusações eram por rancor sentimental. Eram comuns acusações baseadas em ciúmes de homens e mulheres que eram ou abandonados por seus parceiros ou então destratados por cônjuges ou amantes. As acusações, desta forma, eram feitas por medo ou ódio, vingança ou desagravos, inveja ou ciúmes.

É interessante notar que as acusações seguiam a estrutura social da época. Se, por um lado, o Edital de Fé dizia que todos eram iguais perante as leis de Deus, ou seja, qualquer pessoa, independentemente de sua classe social, poderia acusar outra pessoa, por outro lado eram, em geral, os ricos os acusadores e os pobres os acusados. Isto é decorrente da estrutura social vigente, pois os ricos preferiam se confessar logo, contando a sua versão da história, enquanto que os pobres tinham medo de confessar, não só por medo dos possíveis castigos vindos da própria Inquisição, como também dos castigos vindos dos seus chefes ou donos. Ainda, vale lembrar que a grande maioria dos delatores era branca, mostrando a falta de atenção dada a negros e índios. Por último, vale destacar que os “crimes” que mais eram delatados eram crimes de bigamia, sodomia e a má utilização do nome de Deus.

5 de dezembro de 2008

A Inquisição no Brasil (I)

No início da colonização do Brasil, os assim considerados hereges eram enviados a Portugal, e lá era realizado seu julgamento. Foi assim com João Cointa, com Antonio de Gouveia, o Padre de Ouro, e com Silvestre Lourenço. Os três foram presos na colônia e enviados a Portugal, onde, se não foram considerados culpados, conseguiram fugir.

Mesmo assim, não faltaram na colônia os famosos autos-de-fé. Em 1573 ocorreu, em Salvador, o primeiro auto-de-fé realizado na América portuguesa. Um herege francês foi preso e condenado à fogueira. Entretanto, mesmo com estes autos-de-fé acontecendo com relativa freqüência na colônia, aqui não foi instalado um Tribunal do Santo Ofício.

O fato de um Tribunal do Santo Ofício não ser instalado deve-se, primeiramente, a Tomé de Souza, o primeiro governador geral da colônia. Ele soube avaliar os serviços prestados às capitanias pelos cristãos novos, além de mostrar ao governo em Lisboa que, para a instalação de um Tribunal, deveria haver um exército poderoso por aqui, para poder procurar, prender e punir os hereges. Entretanto, o exército estava preocupado com as Índias, de onde vinha, na época, o grosso dos rendimentos portugueses.

Outro fator importante para a não instalação de um Tribunal do Santo Ofício na colônia foi a disputa entre inquisidores e jesuítas. A Companhia de Jesus aliou-se aos cristãos novos, tendo em vista problemas antigos entre esta Companhia e a Inquisição, em Portugal. Como a Companhia de Jesus tinha grande influência na regência espiritual da colônia, ela ajudou à não instalação da Inquisição no Brasil.

Um terceiro fator contra a Inquisição era a própria extensão territorial. A colônia possuía um extenso litoral, que era navegável de acordo com as monções, que ora sopravam em uma direção, ora em outra. Este fato dificultava a fiscalização de todo o território litoral colonial, além da dificuldade em se fiscalizar o interior.

O último fator determinante da não instalação da Inquisição na colônia foi a opinião pública. Esta era totalmente contrária à Inquisição no país, tendo em vista o fato de que os ânimos espirituais dos europeus arrefeciam na colônia. O próprio clero da colônia era um clero de poucas letras, e de nenhum zelo pela salvação das almas; ainda, muitas vezes os sacerdotes levavam uma vida e doutrina pouco ajustada, ou então eram degredados que para cá vieram.

Vale destacar o fato de que D. Henrique solicitou ao bispo de Salvador que este cuidasse dos problemas da colônia: caso algum delito fosse cometido por um índio, que ele fosse convertido ao cristianismo; caso o delito fosse cometido por um judeu, que ele fosse preso e enviado à Inquisição em Portugal. Como os judeus faziam seus ritos publicamente, o Santo Ofício resolveu enviar à colônia um observador, o qual solicitou à população que se confessasse e que delatasse as culpas alheias, de forma a constranger os judeus.

Este observador instalou um tribunal em Salvador, mas o objetivo deste tribunal não era o mesmo dos Tribunais do Santo Ofício: as penas eram muito mais leves, e incitavam apenas o arrependimento. Como exemplo de penas temos o degredo, ou trabalhos forçados e, nos casos mais graves, o envio do réu à Inquisição em Portugal.

A vinda do observador não trouxe nenhum benefício aos cofres portugueses. Com a unificação de Portugal e Espanha, a coroa enviou um novo visitador ao Brasil, este sim com o objetivo de instalar a Inquisição na colônia. Entretanto, por motivos de ambição, este visitador quis ser nomeado inquisidor apenas pelo temor e respeito que tal palavra dava ao seu dono, pois ele deixou em paz a população, mesmo vendo que o judaísmo continuou a aumentar na colônia. Entretanto, vários brasileiros foram enviados a Portugal, e lá sofreram os castigos da Inquisição.

Quando Portugal liberta-se da Espanha, a “Inquisição” volta aos moldes antigos, sendo relativamente frouxa. Entretanto, quando D. Francisco de S. Jerônimo é designado visitador para a colônia, a Inquisição no Brasil atingiu seu auge. D. Francisco era altamente intolerante, no que diz respeito à religião, e em todas as capitanias os judeus foram literalmente caçados. As naus que partiam da colônia levavam dezenas de prisioneiros, às vezes famílias inteiras, para Lisboa.

A Inquisição no Brasil foi “proibida” quando as relações mercantis com a colônia começaram a trazer prejuízos. Muitos engenhos eram de propriedade dos judeus e, desta forma, com a prisão destes judeus, o engenho ficava parado, trazendo prejuízos à metrópole. Houve um declínio das ações da Inquisição por volta de 1725, mas a partir de 1735 a Inquisição volta a agir na colônia, enviando novamente presos religiosos a Lisboa.

A partir de 1740, o número de “hereges” enviados pelo Brasil a Portugal variou bastante. Em alguns anos eram enviados por volta de sete ao ano; em outros, o número subia a quinze. Com a subida ao poder do Marquês de Pombal, este acabou de vez com o Tribunal do Santo Ofício na colônia, dando igualdade de direitos e deveres a todos, cristãos novos e velhos. A perseguição do Marquês de Pombal deu-se àqueles que eram contra o absolutismo, ignorando preceitos religiosos na hora de condenar as pessoas. Com a assinatura do tratado de comércio entre Inglaterra e Portugal, em 1810, ficou definitivamente extinta a Inquisição na colônia.

3 de dezembro de 2008

Geopolítica (III)

Referência bibliográfica para estas perguntas: WEISER, Dieter. Geopolitics – renaissance of a controversial concept in Aussenpolitik (English edition), XL, (4), 4th Quarter’94: 402-11.

1. Recapitule e comente as razões pelas quais o “incômodo” conceito de geopolítica vem sendo resgatado ultimamente, segundo Weiser.

O autor diz que o conceito de geopolítica era muito importante no século XIX, quando todas as então potências mundiais estavam concentradas na Europa. As relações de poder eram definidas não só baseando-se nos recursos que cada país possuía, mas também – e principalmente – na posição geográfica que ocupava. Assim, a Alemanha possuía vantagens e desvantagens em ser um país do centro da Europa, e a Grã-Bretanha também tinha suas próprias vantagens e desvantagens em ser uma ilha. Cabia a cada país engendrar suas possibilidades de forma a assegurar o seu lugar como potência.

Weiser fala também sobre a influência que os “fatores naturais” têm sobre os acontecimentos políticos de determinado país. Alguns autores negaram esta influência, dizendo que o espaço natural nada mais é do que um delimitador do território. Mas Weiser põe objeções a este pensamento, dizendo que não só os aspectos naturais importam – pois pode-se atribuir um valor monetário a estes fatores – como influenciam na determinação das políticas interna e externa nos países. Weiser diz também que a sociedade humana está ligada a estes fatores naturais, o que confirma sua afirmação. O espaço físico é de fundamental importância para a geopolítica, pois, por exemplo, um dos fatores que pode influenciar determinada ação política é a localização física de matérias-primas dentro do território do país.

A importância da geopolítica não se restringiu apenas ao século XIX. Também no século XX, por mais que tenha havido tentativas de “ignorar” este conceito, a geopolítica recebeu atenção. Se no século XIX tínhamos a geopolítica atrelada aos conceitos de potências terrestres e navais, entre e após as duas guerras Mundiais este conceito muda. Esta mudança, contudo, foi vista por alguns autores como uma “queda” da geopolítica, já que o antigo conceito de potências navais e terrestres já não existia, em virtude da existência de armas nucleares e da possibilidade de se usar forças aéreas de forma estratégica. Surgiram conceitos como o de “vizinhança” – onde, teoricamente, a geopolítica só seria importante em relação aos países vizinhos – e a teoria das “esferas de influência”, onde haveria pólos de poder e os países à volta destes pólos seriam influenciados pelos mesmos.

Todos estes conceitos referem-se à geopolítica “clássica”. A geopolítica moderna, ou “crítica”, não leva tanto em consideração a localização geográfica dos países como um fator determinante de sua política, pois esta localização é fixa. Ao invés disso, a geopolítica crítica sugere que a moderna economia globalizada é o principal fator que determina as políticas dos países. O Estado já não consegue controlar muito bem sua economia, o que pode ser mostrado pelo crescimento de grupos transnacionais e bancos, que acabam influindo nas políticas dos países. Como não importa mais a localização geográfica, os países têm de propor políticas que levem em consideração todo o mundo – uma “política global” – e não apenas a sua região, pois suas ações poderão ter efeitos em outras partes do mundo, não apenas dentro do seu próprio território ou no território dos seus vizinhos. O jogo de poder entre os países passa a ser muito mais baseado na economia do que na geografia.

Independentemente da posição adotada, a geopolítica continua sendo importante. O autor diz que, com o surgimento de problemas ecológicos, os quais demandam competência para serem resolvidos, e com as recentes mudanças políticas ocorridas nos últimos anos, a geopolítica está se “reerguendo”. Weiser cita o exemplo da própria Alemanha unificada, que não pode mais enxergar o mundo por meio de “políticas de poder”, e sim por formas de cooperação entre ela própria e seus vizinhos.

Tendo estas idéias em mente, fica relativamente fácil entender a impossibilidade de se “ignorar” a geopolítica. Por mais que não se lide mais com “potências navais e terrestres”, os novos acontecimentos políticos e econômicos da década de 90 – o fim do comunismo, a concretização da União Européia, a criação do Nafta e, futuramente, a possível união entre as duas Coréias, por exemplo – fazem com que a geopolítica seja cada vez mais necessária, mesmo que existam pessoas da escola realista afirmando que não há mais a necessidade da geopolítica como ciência. Talvez, a “acomodação” do poder atualmente seja ainda mais difícil do que há cem anos, justamente por novos problemas surgirem. Poderíamos argumentar que, hoje, não há apenas potências e não-potências: existe uma superpotência, várias potências grandes, várias potências médias, e assim por diante, o que dificulta a manutenção do equilíbrio de poder. Ainda, não é apenas o interesse do Estado nacional que está em jogo: as empresas transnacionais adquiriram “vida própria”, implantando suas políticas comerciais sem depender muito das decisões políticas – pelo contrário, a própria empresa transnacional é que influencia a tomada de decisões do Estado. Sendo assim, deve-se sempre fazer um “reordenamento” do poder, de forma a garantir a estabilidade do sistema mundial.

1 de dezembro de 2008

Geopolítica (II)

(Continuação da postagem anterior.)

Chegamos, enfim, a 1848. Neste ano, diversas revoluções agitaram a Europa, e a estrutura do equilíbrio de poder – na qual se baseava a Santa Aliança – não conseguiu manter a ordem européia. Há a necessidade de um novo fator mantenedor da paz e da ordem, e este fator é a alta finança. Surge, então, o Concerto Europeu.

O Concerto Europeu foi a outra “instituição” existente no século passado. Sua atuação deu-se na segunda metade do século XIX, e era fundamentado não só no equilíbrio de poder, mas principalmente na alta finança – “rede” de banqueiros e comerciantes que influenciava os governos nacionais, e que fez de tudo para garantir a paz e a ordem através de fatores econômicos. Assim, o Concerto Europeu agiu de forma muito mais “sutil” do que a Santa Aliança, tendo em vista o fato de que o Concerto Europeu raramente se utilizava de exércitos para impor sua ordem. Ao invés disso, o Concerto Europeu utilizava o poder econômico para forçar os governos nacionais a manterem a ordem, e a manterem-se na ordem; aquele que não seguisse as regras do comércio internacional não seriam beneficiados com o capital “desenvolvimentista”.

Deve-se lembrar, contudo, que, além da alta finança, também o equilíbrio de poder teve um papel fundamental no período do Concerto Europeu. Isto tanto é verdade que, quando os países europeus se aliaram uns aos outros, com a Inglaterra, a França e a Rússia de um lado, e a Alemanha, a Itália e o Império Austro-Húngaro de outro, este equilíbrio de poder deixou de existir – pois só existiam duas forças econômicas, políticas e militares antagônicas –, o que levou à Primeira Guerra Mundial.

4. Identifique um paralelo e/ou um contraste entre o período estudado por Polanyi e o momento atual da “globalização”.

Há várias formas de se fazer comparações e paralelos entre o século XIX e o período atual do nosso século. Podemos fazer comparações econômicas, políticas, ideológicas, dentre outras.

No aspecto econômico, creio que a maior comparação possível é entre a alta finança e o atual sistema financeiro internacional. Se, no século passado, tínhamos banqueiros que financiavam o desenvolvimento através de obras por todo o mundo, atualmente temos um sistema de instituições que fazem – ou tentam fazer – a mesma coisa. Há várias diferenças, entretanto: uma delas é que, se antes os financiadores eram famílias ricas e poderosas, atualmente são instituições impessoais que têm este papel. Além disso, o objetivo do auxílio econômico atual é diferente do anterior: antes, o dinheiro era utilizado para obras desenvolvimentistas, ou seja, obras que garantiriam a infra-estrutura necessária para a manutenção e expansão do comércio, como ferrovias, por exemplo. Atualmente, o dinheiro é utilizado para obras de cunho mais social, e a infra-estrutura construída atualmente tem como objetivo o bem-estar da população.

No campo político, temos a questão do equilíbrio de poder. No século XIX, este equilíbrio era muito visível, apesar de ser imposto, de ser forçado; tanto que o próprio Polanyi fala de uma “paz armada”, ou seja, os países mantinham-se “amigáveis” uns aos outros mas ao mesmo tempo se preparavam para eventuais conflitos armados. Além disso, mesmo havendo uma potência hegemônica – a Inglaterra –, havia outras grandes potências no cenário internacional, as quais tinham de ser tratadas “de igual para igual” em relação aos outros países.

A situação atual possui semelhanças, mas principalmente diferenças. Até há dez anos atrás, havia o sistema de equilíbrio de poder – mas, diferentemente do equilíbrio do século passado, que era multipolar, o equilíbrio do século XX foi bipolar, com duas superpotências mundiais disputando áreas de influência. Mesmo após a queda do comunismo, contudo, ainda existe o sistema de equilíbrio de poder, mas de uma forma diferente: as potências grandes e médias estão se unindo para fazer frente à única superpotência atual – os Estados Unidos. É o que ocorre, por exemplo, com a União Européia – união de potências grandes – e, em escala menor, com o Mercosul – união de potências médias e pequenas. Não podemos esquecer, entretanto, da possibilidade muito real de surgimento de novas potências que possam fazer frente aos Estados Unidos, pelo menos em alguns campos – como é o caso da China e, ainda hoje, da Rússia.