22 de março de 2009

Campo de Concentração de Dachau

Minha primeira parada na viagem pelos campos de concentração nazistas se deu em Dachau. A cidade de Dachau, na Alemanha, se localiza no estado da Baviera, no sul do país, a cerca de 20 km a noroeste da cidade de Munique. A cidade foi fundada no século VIII e atualmente tem uma população de mais ou menos 40 mil habitantes. O centro da cidade é tipicamente medieval, havendo lá um castelo do século XVIII.

Nos arredores da cidade localiza-se o campo de concentração de Dachau, que foi o primeiro campo de concentração de grande escala da Alemanha nazista. O campo de concentração foi aberto em 1933, no terreno de uma antiga fábrica de pólvora, e funcionou até 1945, sendo o campo de concentração que por mais tempo ficou funcionando.


A importância do campo de concentração de Dachau não se encontra apenas no número de prisioneiros (aproximadamente 200 mil pessoas de mais de 30 países, sendo aproximadamente um terço judeu e os demais chamados de “prisioneiros políticos”, inclusive membros da Igreja Católica) nem no número de mortos (por volta de 35 mil pessoas), mas também no fato de que, por ter sido o primeiro, o campo de Dachau se tornou o modelo para os demais campos de concentração nazistas. Além disso, o campo de Dachau foi o segundo a ser liberado pelas tropas americanas ao final da Segunda Guerra Mundial, sendo, portanto, um dos “responsáveis” por mostrar ao mundo os horrores do regime nazista.

O campo de Dachau era dividido em duas áreas: a parte do campo propriamente dito e o crematório. O campo era composto por 32 barracões, um dos quais era utilizado para as experiências médicas realizadas pelos médicos nazistas. A área central era utilizada para as execuções sumárias, realizadas em locais públicos como forma de “dar exemplo” para aqueles que tentassem se rebelar contra sua situação. O campo era circundado por um poço e por uma cerca de arame farpado eletrificado, além de sete torres com guardas cujas ordens eram bem simples: atirar na cabeça daqueles que tentassem fugir.

Muitas “melhorias” foram realizadas em Dachau com base no trabalho forçado do campo. Dentre tais “melhorias” destacam-se as construções de outros prédios dentro do próprio campo, construções estas realizadas sem a ajuda de nenhum tipo de máquina: os prisioneiros construíram tudo com as próprias mãos. Era uma das maneiras irônicas pelas quais os nazistas puniam seus prisioneiros: os próprios prisioneiros construíam, sem qualquer auxílio, os prédios nos quais eles mesmos, futuramente, seriam mortos.

Próximo do fim da Segunda Guerra Mundial, quando os Aliados se aproximavam do campo, os nazistas resolveram fugir levando consigo o máximo de prisioneiros. Estes eram levados a caminhar o máximo possível na neve em direção a locais mais centrais da Alemanha. Os prisioneiros ficavam sem nenhuma comida ou água por dias, o que levou à morte de centenas (ou até milhares) de prisioneiros no caminho a partir de Dachau. Além disso, vários prisioneiros foram assassinados no próprio campo antes de serem evacuados: estima-se que do final de 1944 até abril de 1945, quando o campo foi liberado, 15 mil prisioneiros foram mortos, incluindo-se 500 prisioneiros de guerra soviéticos – que eram os que mais sofriam neste campo de concentração.

Feitas as devidas “apresentações técnicas” sobre o campo, passo agora a descrever com mais detalhes o campo propriamente dito. A entrada já nos deixa apreensivos: é visível ainda a presença de trilhos, responsáveis por trazer os prisioneiros para o campo. Fala-se no fato de que, ao final da Segunda Guerra Mundial, os prisioneiros considerados “incapazes” eram mortos na própria plataforma do trem, não chegando nem mesmo a entrar no campo de concentração.


Entrada do campo de concentração de Dachau

Abaixo a entrada do campo de concentração de Dachau, com a infame frase "Arbeit macht frei" -- ou seja, "o trabalho liberta". Libertação esta que ocorria por meio da morte...


Como já informado anteriormente, o campo possuía uma ampla área central, na qual execuções sumárias ocorriam. Era uma tentativa de punir pelo exemplo: vendo seu companheiro ser morto em praça pública, quem se arriscaria a tentar fugir?

Área central do campo de Dachau

Área central do campo de Dachau

Dachau foi o primeiro de inúmeros campos de concentração criados pelos nazistas, como se pode ver pela imagem abaixo:


Abaixo uma foto da época, mostrando a chegada dos prisioneiros ao campo de concentração.


O campo hoje funciona como um memorial, sendo possível visitar as áreas em que os prisioneiros ficavam. Abaixo um dos blocos centrais do campo, local no qual estava a administração central.


Um dos objetivos dos nazistas era transformar seus prisioneiros de "humanos" em "não-humanos". Nesse sentido, uma das táticas utilizadas foi a de raspar os cabelos -- que seriam utilizados com outros fins --, objetivando-se transformar todos em indivíduos semelhantes. A ausência de individualidade, assim, faria com que os prisioneiros deixassem de se sentir como indivíduos, passando a serem vistos como "apenas mais um" na multidão visualmente igual. Abaixo uma foto mostrando a posição padrão do prisioneiro: o lento caminhar olhando para baixo, reduzindo-o a nada mais do que uma mera ferramenta para se atingir um objetivo.


No processo de aniquilação da individualidade humana, eram "dadas" aos prisioneiros roupas iguais -- o vulgo "pijama". Os prisioneiros recebiam apenas a roupa da fotografia abaixo e mais nada. Deveriam cuidar das mesmas da melhor forma possível. Foi-nos dito que os prisioneiros chegavam a ficar com a mesma roupa sem lavar por até 3 meses seguidos. Não havia qualquer tipo de roupa adicional durante o inverno, que na região pode eventualmente chegar na casa dos -25 graus (como aconteceu em alguns anos durante o funcionamento do campo).

Além disso, o prisioneiro era completamente responsável pela sua roupa e por tudo que pudesse acontecer com ela. Nesse sentido, os nazistas criaram os mais absurdos tipos de punição em relação à roupa. Se a roupa estivesse suja, o prisioneiro seria punido (mas não havia possibilidade de lavá-la com frequência). Se estivesse um botão faltando (caído durante o trabalho forçado, por exemplo), o prisioneiro seria punido. Se um botão caísse e o prisioneiro se desse conta do fato e buscasse guardar o botão para recosturá-lo posteriormente, o prisioneiro era punido -- pois estava colocando em seu bolso propriedade privada da Alemanha (o botão). Como se percebe, qualquer coisa era motivo de punição -- não apenas pelos guardas nazistas, mas também por parte dos próprios prisioneiros que auxiliavam os nazistas na "manutenção da ordem" interna do campo.


Na foto abaixo se apresenta, segundo informações coletadas, um dos principais meios de punição por parte dos nazistas -- e um dos mais utilizados. Como se percebe pela foto, o objetivo era surrar o prisioneiro com a vara de madeira. Dois detalhes devem ser destacados:

1) Em algumas ocasiões a vara de madeira era substituída por um vergalhão de ferro revestido de borracha;

2) A punição mínima, "padrão", era de 25 chibatadas... Por cada um dos guardas que se apresentavam para punir o prisioneiro. Como o mínimo estabelecido eram de 2 guardas, o prisioneiro levaria, no mínimo, 50 chibatadas. E com um detalhe ainda mais sádico: era o próprio prisioneiro que deveria contar quantas chibatadas estava levando. E a contagem deveria ser em alemão. Caso o prisioneiro errasse a contagem, ou falasse um número errado (por não saber falar alemão), os guardas recomeçavam a surra a partir do zero, reiniciando a contagem das chibatadas até que o prisioneiro acertasse. Desnecessário dizer que vários prisioneiros morreram de tanto apanhar no instrumento abaixo.


Abaixo uma "sala do chuveiro". Não era a famosa "sala do chuveiro" associada aos crematórios (não ainda), mas uma sala na qual os prisioneiros mais resistentes eram encaminhados com o objetivo de tomar um banho gelado para, em seguida, serem jogados na neve (no período do inverno).


Abaixo fotos dos corredores centrais do prédio principal do campo de Dachau.


Outra visão do corredor central do prédio principal

Um dos prédios do campo era utilizado para experimentos médicos. Em Dachau, os principais experimentos diziam respeito a questões relacionados ao congelamento e/ou hipotermia do ser humano. A justificativa era que a Luftwaffe (Força Aérea Alemã) precisava descobrir como recuperar seus pilotos que eram abatidos no Mar do Norte, local com águas bastante geladas, e também para preparar os soldados alemães em seus enfrentamentos contra a União Soviética. Sendo assim, a partir de 1941 a Luftwaffe conduziu experimentos para aprender como tratar a hipotermia. O estudo forçou pessoas a ficarem em um tanque de água gelada por até três horas. Outros estudo colocaram prisioneiros nus em campo aberto durante várias horas com temperaturas abaixo de zero.

Os experimentos de congelamento eram divididos em duas partes: primeiramente era preciso determinar quanto tempo seria necessário para baixar a temperatura corporal até a morte, e segundo, qual a melhor forma de reanimar a vítima congelada. As seleções para os experimentos eram feitas entre jovens saudáveis judeus e russos. Eles estavam nus e preparados para o experimento. Uma sonda que mede a diminuição da temperatura corporal era inserida no reto, e era mantida no lugar por um anel metálico expansível, que foi ajustada para abrir dentro do reto para segurar a sonda firmemente no lugar. A vítima era colocada em um uniforme da Força Aérea, e depois colocada na poça de água fria e começava a congelar.

Foram realizados também experimentos a fim de investigar a imunização para o tratamento da malária. Detentos saudáveis foram infectadas pelo mosquito ou por injeções de extratos de glândulas mucosas das fêmeas de mosquitos infectados. Depois de contraírem a doença, estas pessoas foram tratadas com várias drogas para testar sua relativa eficiência. Mais de 1.000 pessoas foram utilizados nesses experimentos, e desses, mais da metade morreu como resultado.

Por fim, experimentos foram realizados em Dachau para estudar vários métodos de tornar a água do mar potável. Em certo momento, um grupo de cerca de 90 ciganos foram privados de comida e água, sendo dada de beber somente água do mar. Os ciganos ficaram tão desidratados que lambiam os pisos recém-lavados, numa tentativa de obter água potável.


Sala dos experimentos médicos em Dachau

A foto abaixo fala por si mesma.


Abaixo uma ilustração de outro mecanismo de tortura típico dos nazistas. O prisioneiro era atado pelos pulsos, com seus braços presos atrás de si (nas costas). Seus pulsos eram afixados em um tronco, ou na parede, e os presos eram colocados sobre banquinhos. Durante a tortura, caso o preso não dissesse o que se esperava, os banquinhos eram retirados, fazendo com que os braços e os ombros fossem deslocados, causando imensa dor. Imaginem-se pendurados a uma parede com os braços atados atrás, sendo puxados para cima, e de repente você perder seu ponto de apoio e seu braço subir acima da sua cabeça...


Nas fotos abaixo há a transcrição de um diário de um prisioneiro do campo de concentração de Dachau, no qual o prisioneiro conta um pouco do seu dia a dia no campo.


Nas fotos abaixo a explicação das chamadas "celas de ficar em pé". Eram locais de 70 cm quadrados nos quais se colocavam até 4 prisioneiros ao mesmo tempo, que ficavam presos por no mínimo 72 horas seguidas. Mesmo que se colocasse apenas um prisioneiro, era impossível se sentar, deitar ou ficar em qualquer outra posição que não fosse de pé.


Foto de uma "cela de ficar em pé"

Mais uma foto da área central do campo de concentração

Abaixo uma foto da área na qual se localizavam os 32 barracões do campo de concentração. A área de cada barracão é demarcada por pedras.


Representação dos locais nos quais se situavam os barracões

Abaixo a reconstruçaõ das camas nas quais os prisioneiros dormiam. No início do campo cada preso tinha sua própria cama; com o passar do tempo e com o aumento de prisioneiros, chegou-se a ter 5 prisioneiros dormindo ao mesmo tempo em cada uma dessas camas.


Abaixo uma foto do "chuveiro" dos prisioneiros. Eles tinham 5 minutos para tomar banho, que acontecia oficialmente uma vez por semana. Na prática, entretanto, chegou-se a haver prisioneiros que ficavam até 3 meses sem tomar banho, com a mesma roupa.


Abaixo uma foto mostrando a cerca e o poço que circundavam todo o campo de concentração. Esta era uma área extremamente perigosa para os presos e, por outro lado, uma área de grande "divertimento" para os soldados nazistas. Os presos eram proibidos de pisar na faixa com grama: deveriam se restringir à parte de concreto (do lado direito na imagem). Caso os presos pisassem a grama, os guardas das torres tinham ordens para atirar na cabeça. Assim, soldados alemães que transitavam pelo campo se "divertiam": tiravam o boné ou chapéu de um preso e jogavam o boné na grama, ordenando que o preso fosse buscá-lo. Se o preso fosse buscar o boné seria morto pelo guarda da torre; se não buscasse seria morto pelo guarda transitando pelo campo por ter desobedecido a uma ordem direta.


Abaixo uma foto daquilo que se tornou um símbolo do nazismo: o crematório.


Abaixo a foto do forno do chamado "crematório antigo". Como se vê há apenas dois fornos, os quais, com o passar do tempo, se tornaram incapazes de incinerar os presos devido à quantidade destes últimos. Decidiu-se, assim, construir um novo crematório (o da foto anterior), que foi construído pelos próprios presos.


Abaixo uma foto do crematório em funcionamento.


Abaixo uma foto dos corpos encontrados durante a liberação do campo, em 1945, e que seriam queimados no crematório.


Abaixo foto do interior do crematório: a famosa "sala do chuveiro". Dos buracos no teto não saía nenhuma água; mas dos dois buracos na parede saía o gás que matava os presos em questão de minutos.


Abaixo foto do novo crematório, com 4 novos fornos responsáveis pela queima de corpos em Dachau.


Abaixo uma escultura que é o símbolo do campo de Dachau: diversos corpos presos a uma cerca de arame farpado.


Escultura feita no pós-Segunda Guerra Mundial.


"Nunca mais", placa presente no centro do campo de Dachau.


Placa instigando a busca eterna pela paz e pela liberdade.


O fim da visita... E o início de diversas impressões e de alterações no pensamento das pessoas que visitaram o campo.


Por fim, um vídeo (não feito por mim) que mostra mais algumas imagens do campo de Dachau além daquelas já apresentadas nesta postagem.


16 de março de 2009

Munique

Minha viagem começou pela capital da Bavária, a cidade de Munique. A cidade fica ao sul da Alemanha e tem aproximadamente 1,35 milhão de habitantes, sendo a terceira maior cidade daquele país (maiores informações demográficas aqui). A cidade é mundialmente famosa pela Oktoberfest, bem como por ser a sede da BMW.

A importância da cidade para o tema a ser debatido diz respeito ao fato de que foi aqui que surgiram os primeiros movimentos nazistas, ainda durante a década de 1920. Em 1923 Hitler e seus apoiadores realizaram um golpe de estado para acabar com a República de Weimar, golpe este que fracassou. Como resultado do fracasso, houve a prisão de Hitler e a colocação do Partido Nacional-Socialista (= Nazista) – então praticamente desconhecido fora de Munique – na ilegalidade.

A partir de 1933, o Partido Nazista se fortaleceu novamente na cidade com a tomada do poder – legal – por parte deste partido em toda a Alemanha. Foi criado o primeiro campo de concentração da Alemanha nazista na cidade de Dachau, a 16 km de Munique. Devido à sua importância para o nazismo, a cidade passou a ser chamada de “Hauptstadt der Bewegung” (“a capital do movimento”), especialmente devido ao fato do quartel-general do Partido Nazista estar situado na cidade.

Foi também nesta cidade que o então primeiro-ministro britânico, Neville Chamberlain, juntamente com representantes da França e da Itália, assinou a carta que ficou conhecida como “política de apaziguamento”, na qual o Reino Unido aceitava a invasão da então Tchecoslováquia pela Alemanha nazista. Chamberlain aceitou tal fato na esperança de que seria melhor aceitar a invasão de partes de um estado pela Alemanha do que iniciar uma nova guerra mundial. Assim, acreditava-se que a paz com a Alemanha deveria ser mantida a qualquer custo, mesmo que as constantes violações de Hitler a diversos tratados internacionais tivessem de ser ignoradas.

Ainda de se notar foi o movimento “Rosa Branca”, de oposição a Hitler, e surgido na cidade entre 1942-3. Os membros de tal grupo foram presos pela polícia nazista e executados.

Por fim, destacar o fato de que a cidade foi fortemente bombardeada durante a Segunda Guerra Mundial. Como resultado, entre 60% e 70% de suas construções foi destruída naquele período. Após a Segunda Guerra Mundial, a cidade foi completamente reconstruída.

Placa em homenagem aos policiais mortos durante a tentativa de golpe de estado em 1923


Exemplo de prédio "sobrevivente" da Segunda Guerra Mundial, com a parte inferior enegrecida devido a incêndios


Local a partir do qual Hitler fazia seus discursos para a juventude nazista em Munique