16 de setembro de 2007

Formação econômica do Brasil (II)

Dando continuidade à nova série sobre a formação econômica do Brasil durante o período colonial, abaixo apresento as idéias do livro de Celso Furtado, "Formação econômica do Brasil", cap. V ao IX.

Fica claro que o objetivo português, desde o início, era o cultivo da cana, tendo em vista o êxito que a economia açucareira teve no Brasil.

O principal obstáculo aos colonos era a falta de mão-de-obra: não havia pessoal para instalar os engenhos. Por isso, a escravidão era a única saída, e esta escravidão teve início com a captura de índios.

O índio foi quem deu impulso à economia açucareira. Isto fica claro se observarmos que, quando os escravos negros chegaram, a economia açucareira já existia, e os negros foram usados para a expansão da mesma, que já estava instalada, e não para a sua criação.

O índio foi também a razão de existência das comunidades “não-açucareiras”. Isto significa dizer que as comunidades que não dedicavam-se ao açúcar dedicavam-se à captura e ao comércio dos índios. Além disso, estas comunidades dedicavam-se ao recolhimento de madeira para ser vendida ao engenho, tendo em vista que o consumo de lenha era muito grande para fazer um engenho funcionar.

Com a introdução do escravo negro, entretanto, é que deu-se a expansão da economia açucareira. Tal fato pode ser comprovado quando vemos que o volume de açúcar vendido ao exterior era extremamente grande, e do total vendido 90% do valor negociado ficava nas mãos da classe de proprietários de engenhos, ou seja, a pequena colônia era extremamente rica.

Foram estes lucros exorbitantes que permitiram à colônia duplicar sua capacidade de produção a cada dois anos. Tudo indica que este foi o ritmo de crescimento nas etapas mais favoráveis. Ainda, tais lucros permitiram à classe dominante que importasse bens supérfluos, bens que apenas aumentariam o luxo desta própria classe. Como exemplo, dados indicam que em 1639 foram arrecadadas dezesseis mil libras de impostos, e cerca de um terço deste valor era referente a vinhos.

Mesmo com tal gasto em bens supérfluos, estima-se que os senhores de engenho retivessem em suas mãos o mesmo montante que gastavam com importações. Desta forma, ainda que houvesse excesso de dinheiro, a colônia não caiu no erro da superprodução, o que derrubaria os preços, graças à habilidade dos comerciantes do negócio açucareiro.

No início da indústria açucareira, as principais preocupações dos senhores de engenho eram os equipamentos e a mão-de-obra especializada. Os equipamentos tinham de ser importados; os índios foram utilizados como mão-de-obra não-especializada, para prover comida e para as instalações iniciais do engenho. A mão-de-obra especializada, que no início era importada, passou a ser criada internamente, pelo treinamento dos escravos com maiores aptidões para trabalhos manuais.

Diferentemente de uma economia industrial, a construção de engenhos na economia escravista não gerava fluxo de renda monetário, pois a força utilizada para a criação e operação do engenho não era remunerada, e o lucro proveniente das vendas ficava com o senhor de engenho. Também o próprio trabalho escravo não gerava fluxo de renda, pois as tarefas executadas pelos escravos traziam melhoramentos locais, apenas aumentando o ativo do senhor de engenho.

O único fluxo de renda existente era no comércio exterior. Isto porque o senhor de engenho gastava quando tinha de importar algo e recebia quando vendia açúcar para o exterior. Desta forma, o senhor de engenho deveria saber o que fazer para aumentar ao máximo seus lucros neste comércio. Os gastos do engenho, se comparados com o que era arrecadado, eram ínfimos, pois o engenho tinha um gasto fixo, que não mudava, além de gastos com lenha e comércio com as pequenas vilas que surgiram para captura de índios.

Portanto, a palavra crescimento tinha um significado restrito na economia da colônia: seria apenas a ocupação de novas terras e aumento de importações. Isso porque a economia era baseada apenas nisso – exportação de açúcar e importação de bens de consumo –, não havendo mais nada a ser inserido neste esquema. A capacidade produtiva foi, portanto, altamente controlada, evitando-se que houvesse uma superprodução e os preços caíssem. Também era interessante a procura de novos mercados consumidores, ampliando o horizonte do comércio do açúcar.

A economia dependia totalmente do mercado externo. Caso a procura diminuísse, os lucros do senhor de engenho também diminuiriam, ocasionando uma mão-de-obra excedente. Esta mão-de-obra poderia ser utilizada para a expansão da capacidade produtiva, pela ocupação de novas terras, ou então para a obras de construção que trouxessem mais bem-estar à classe dominante.

Mesmo com a procura externa baixa, ainda era vantajoso para o senhor de engenho produzir, pois os custos eram fixos. Isto foi possível pela política de desvalorização da moeda empreendida pela coroa portuguesa, fazendo com que, mesmo se houvesse queda nas vendas, os senhores de engenho tivessem seu lucro garantido, incentivando cada vez mais a produção. Fica claro que o açúcar trazia grandes lucros para Portugal, tal foi o estímulo dado ao produto. Esta vantagem, contudo, era até certo ponto: abaixo deste ponto o senhor de engenho não poderia sustentar os gastos.

Referências bibliográficas:

FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. 19ª Ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1984. Cap. V-IX. Pág. 19-53.


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