23 de setembro de 2007

História do pensamento econômico (II)

Dando continuidade à série "História do pensamento econômico", coloco abaixo mais itens que compõem a chamada "escola clássica da economia", cujo principal representante é Adam Smith.

LIBERDADE DE COMÉRCIO

Outro aspecto importante da teoria de Smith é a defesa da liberdade de comércio e o ataque ao mercantilismo, que ele considera ser uma teoria elaborada pelos comerciantes para proteger os seus próprios interesses.

Retomando o argumento de Hume, de que os preços acompanham o aumento ou diminuição de moeda, e salientando o fato de Portugal e Espanha, como proprietários de minas, serem meros distribuidores de ouro e prata para os outros países da Europa, Smith diz:

Os altos preços de todas as outras mercadorias, que são o efeito necessário do excesso de metais preciosos, desencoraja tanto a agricultura como as manufaturas de Espanha e Portugal. (SMITH, citado por CANO, 1998, p. 49)

Smith combate, portanto, a intervenção do Estado no controle do comércio externo: "Os prêmios à exportação do trigo [na Inglaterra] atuam exatamente no mesmo sentido da absurda política de Espanha e Portugal: permite aos estrangeiros comer mais barato o nosso trigo" (SMITH, citado por CANO, 1998, p. 59).

CONTRA A TEORIA MERCANTILISTA DA MOEDA

Grande parte da argumentação de Smith destina-se a provar o erro dos mercantilistas na sua defesa de que um país seria tanto mais rico quanto maior quantidade de ouro e prata fosse acumulada pelo seu soberano.

Começa logo por salientar que a economia, considerada como o ramo da ciência de um estadista ou legislador, propõe-se assim enriquecer tanto os indivíduos como o soberano. Ou seja, uma nação também enriquece quando enriquecem os indivíduos, e não apenas o governo.

Para provar este argumento, Smith recorre abundantemente aos exemplos da Espanha e de Portugal, que têm muito ouro e leis proibindo a sua saída (políticas mercantilistas), mas que mesmo assim não conseguem impedir a perda desses metais, além de se tornarem países pobres.

CONTRA OS MONOPÓLIOS

Na batalha de Smith contra as idéias mercantilistas, ele recorre freqüentemente ao exemplo português, atacando especialmente a constituição de monopólios, seja do rei, seja de particulares. "De todos os expedientes que se podem utilizar para travar o crescimento natural de uma colônia, o de uma companhia exclusiva é, sem dúvida, o mais eficaz", afirma Smith (citado por CANO, 1998, p. 61), e apresenta como exemplo o do monopólio do comércio com as províncias de Pernambuco e Maranhão, no Brasil, política que foi adotada por Portugal depois de ter sido abandonada por todas as outras nações. Smith conclui que, com tais políticas, as colônias de Espanha e Portugal encorajam mais a indústria de outros países do que a de Espanha e Portugal.

Defensor da liberdade de comércio e da liberdade dos indivíduos em termos de atividade econômica (por causa da "mão invisível"), Smith também se insurge contra as leis restritivas da produção e comércio que a Grã-Bretanha aplica às suas colônias da América, argumentando que "proibir um grande povo de fazer o que quiser da sua própria produção ou de empregar o seu capital e indústria da maneira que consideram mais vantajosa constitui uma manifesta violação dos mais sagrados direitos da humanidade" (SMITH, citado por CANO, 1998, p. 62).

Qual a origem das políticas mercantilistas? Segundo Smith, são os mercadores, desejosos de obter elevados lucros, que defendem essas políticas e influenciam os governantes. É certo que, protegidos pelos monopólios, alguns mercadores ganham mais. Todavia, a política mercantilista, contribuindo para exagerar o afluxo de metais preciosos, faz subir os preços internos, dificultando o aumento de capital (ou seja, o investimento em atividades produtivas) e, dessa forma, diminuindo os ganhos totais que um país pode obter.

No entanto, no caso dos monopólios, há lugar para uma exceção: Smith admite o apoio a monopólios temporários, para compensar os mercadores que se encarregam, por sua conta e risco, de estabelecer um novo ramo de negocio em qualquer nação bárbara e remota; mas, uma vez expirado o prazo, o monopólio deveria naturalmente terminar.

CONTRA A INTERVENÇÃO DO ESTADO

A defesa de Smith das vantagens da iniciativa privada tem como contrapartida a sua desconfiança das intervenções do estado na economia. Já o vimos a propósito dos monopólios comerciais.

Smith manifesta-se contra as despesas públicas, com base no pressuposto de que gastos públicos, financiados por impostos ou dívida pública desviam trabalho produtivo para empregos improdutivos. "As grandes nações não são jamais arruinadas pela prodigalidade e mau emprego dos capitais privados, embora às vezes o sejam pelos públicos ... Na maior parte dos países a totalidade ou quase totalidade das receitas públicas é empregada na manutenção de indivíduos não produtivos" (SMITH, citado por CANO, 1998, p. 64).

De novo busca o exemplo das nações ibéricas: "A indústria não é aí [na Espanha e em Portugal] nem livre nem segura e os governos civis e eclesiásticos de Espanha e Portugal são de tal ordem que só por si seriam suficientes para perpetuarem o seu atual estado de pobreza ... Esta má política não é, nesses países, contrabalançada pela liberdade e segurança geral do povo" (SMITH, citado por CANO, 1998, p. 64).

TRABALHO PRODUTIVO E IMPRODUTIVO

Adam Smith segue de perto a argumentação dos fisiocratas quanto à classificação de trabalho produtivo ou improdutivo, mas introduz uma importante alteração. Os fisiocratas consideravam como produtivos apenas os agricultores e os proprietários de terras, pertencendo os restantes às classes estéreis.

Smith aceita a definição fisiocrática das classes produtivas (agricultores e os proprietários). Todavia, no caso dos mercadores, artífices e manufaturadores, introduz uma nuance: estes não são totalmente "estéreis". Para Smith, "produtivos" seriam aquelas classes que, além de produzirem para o seu sustento, ainda produzem um excedente de riqueza (produto líquido, ou seja, depois de se deduzirem os gastos na sua manutenção). E afirma que "é por isso que coloquei os artífices, manufaturadores e mercadores nos trabalhadores produtivos, e os trabalhadores domésticos nos trabalhadores estéreis e improdutivos" (SMITH, citado por CANO, 1998, p. 65).

(Continua na próxima postagem.)

Referências bibliográficas:

CANO, Wilson. Introdução à economia: uma abordagem crítica. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998.

SAMUELSON, Paul A. & NORDHAUS, William D. Economia. 12ª Edição. Lisboa: McGraw-Hill, 1988.


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