25 de abril de 2008

Legitimidade (II)

(Continuação da postagem anterior.)

4. Legitimidade-"crença" e legitimidade-"poder"

Independentemente de a legitimidade ser objetivista ou subjetivista, há um ponto em comum entre estas duas tendências: ambas são baseadas na crença.

A tendência subjetivista, usada e propagada por Weber, baseia-se na crença psicológica, ou seja, o indivíduo crê, ele mesmo, na capacidade do governo, legitimando-o, enquanto que a objetivista, que foi objeto de estudo de Rousseau, é baseada na crença social, isto é, o indivíduo crê não por si mesmo, mas porque é forçado a crer.

Entretanto, para melhor analisarmos a legitimidade, devemos tomar por base a ideologia de governo, ou seja, a crença que os governantes têm neles mesmos, ao invés de basearmo-nos na crença dos governados.

Contudo, se utilizarmos esta proposição para analisarmos a legitimidade, poderemos não obter uma descrição satisfatória da mesma, pois devemos também analisar a perspectiva de baixo para cima. Isto significa que não adianta analisarmos a ideologia dos governantes se não levarmos em consideração os sentimentos dos governados.

É aí que surge um novo mecanismo para conceituarmos legitimidade: em termos de poder. Surge, então, o papel da credibilidade no governo. Um governo será considerado legítimo quando usa outras formas de poder (coerção econômica, violência, etc.). Aqui vemos que o componente psicológico de crença continua latente, mas não como uma fé cega, e sim de credibilidade. Acreditamos no governo porque ele dá mostras de que tem capacidade para desempenhar suas funções, e não simplesmente porque acreditamos.

Esta, contudo, também não é uma das melhores idéias para conceituar-se legitimidade. Afinal de contas, que é a legitimidade senão a experiência da validade de certa ordem normativa? Por exemplo, alguém se curva diante do poder partindo do conhecimento de que haverá represálias em caso de desobediência.

Por fim, poderíamos dizer que devemos analisar a legitimidade através da situação de poder, e neste sua variedade. Situações de poder definidas pela coerção ou pela influência não deixam muito espaço para os sentimentos de legitimidade. Situações de autoridade sem consentimento denota uma relação de poder sublegítima. Apenas situações caracterizadas pela autoridade baseada no livre consentimento podem ser compatíveis com sentimentos conscientes de legitimidade.

Podemos, pois, dizer que a análise de Rousseau baseia-se na visão de justificativa do poder oferecida pelos governantes, enquanto Weber baseia-se na autoridade legítima em favor dos governados.

5. A emergência da teoria social: o nascimento da idéia de problema social no Iluminismo

A teoria social que conhecemos atualmente origina-se no Iluminismo, baseada em quatro vertentes à mesma relacionados: a preocupação com os determinismos que afetam os processos sociais, a lógica da pesquisa lockiana, que adota o método científico de estudar a sociedade, a separação de Estado e sociedade e, por fim, o impulsionamento da emancipação.

Este último trata da "libertação do homem da tutela que ele mesmo se impôs", segundo Kant, o que significa que o homem pode criticar as instituições que ele mesmo criou para tomar suas decisões por ele. Isto gerou uma nova desconfiança quanto à legitimidade dessas instituições.

Esses quatro fundamentos foram os responsáveis pelas mudanças radicais de pensamento do século XVIII, levando os pensadores da época a questionar dogmas religiosos, o objetivismo moral, e que levou Rousseau à reorganização da teoria do contrato social.

Mesmo que diversas, as teorias quanto a validade das disposições sociais exibem mentalidade reformistas, pregando a "eliminação da reverência no âmbito das atitudes sociais", pelo "hábito de exigir resultados", como definiu Charles Fraenkel, originando a idéia de que existam os chamados "problemas sociais". Estes são os males e deficiências provenientes de instituições criadas pelo homem, e por isso mesmo, reformáveis através da intervenção da razão crítica. A teoria social moderna nada mais é do que isso, a abordagem crítica e científica dos problemas sociais e, entre eles, a questão da legitimidade.

No século XVIII, as críticas quanto à legitimidade ficaram ainda presas ao tradicionalismo. Montesquieu mostra claramente isso, quando coloca entre as formas legítimas de poder uma ilegítima: o despotismo.

A teoria social aprofunda e expande a compreensão crítica do fenômeno da legitimidade e da ilegitimidade, debatendo os fundamentos sociais dos padrões de autoridade política existentes ou ideais. Amplia a pesquisa sobre a legalidade de práticas e instituições sociais, expandindo o conhecimento sobre a legitimidade, dando novas concepções para se formar o sentimento de validade.

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