30 de abril de 2008

Liberalismo (III)

(Continuação da postagem anterior.)

CONSIDERAÇÕES SOBRE O LIBERALISMO E A DEMOCRACIA

O liberalismo é uma ideologia, um sistema de idéias e prescrições, enquanto a democracia é uma forma igualitária de condução da sociedade. A democracia é um método, que diz respeito à forma como as pessoas irão participar nas decisões coletivas. O liberalismo é bem mais amplo, pois não se restringe apenas à forma como as pessoas participarão das decisões coletivas, mas também diz respeito à própria forma como as pessoas irão conduzir suas vidas.

Vale destacar também que a liberdade, defendida pelo liberalismo, deve ser vista como uma característica individual, ou seja, cada indivíduo deve ter a sua própria liberdade para fazer aquilo que bem entender. A liberdade, nesse caso, pode ser associada a sentimentos como medo, crença e interesse, no sentido de serem individuais. Já a democracia é existente fora do indivíduo e, por isso mesmo, é um conceito coletivo.

O critério meritocrático (de distinção) é uma das bases do liberalismo: todos os indivíduos têm o mesmo ponto de partida e se diferenciam devido ao esforço individual de cada um, não se considerando o resultado final. Já a democracia baseia-se no critério igualitário, onde o ponto de partida de cada indivíduo é ignorado, e a ênfase está no ponto de chegada de todos -- a igualdade.

O indivíduo, para o liberalismo, é abstrato, pois é formalmente igual a todos os outros. Porém, de forma alguma isso acontece na realidade -- conforme já dito anteriormente, o que importa para o liberalismo é o ponto de partida (a igualdade), e os resultados são diferentes devido ao esforço próprio de cada um. Dessa forma, não há homogeneidade social, com conseqüente estratificação da sociedade. Já para a democracia o indivíduo não é abstrato, é real, pois é no âmbito democrático que todos se expressam e onde há espaço igual para a manifestação comum das diferenças entre cada indivíduo.

RELAÇÃO ENTRE LIBERALISMO E DEMOCRACIA

"O pressuposto filosófico do Estado liberal (...) é a doutrina dos direitos do homem elaborada pela escola do direito natural: doutrina segundo a qual o homem, todos os homens, indiscriminadamente, têm por natureza e, portanto, independentemente de sua própria vontade, e menos ainda da vontade de alguns poucos ou de apenas um, certos direitos fundamentais, como o direito à vida, à liberdade, à segurança, à felicidade -- direitos esses que o Estado, ou mais concretamente aqueles que em um determinado momento histórico detêm o poder legítimo de exercer a força para obter a obediência a seus comandos devem respeitar, e portanto não invadir, e ao mesmo tempo proteger contra toda possível invasão por parte dos outros. Atribuir a alguém um direito significa reconhecer que ele tem a faculdade de fazer ou não fazer algo conforme seu desejo e também o poder de resistir, recorrendo, em última instância, à força (própria ou dos outros), contra o eventual transgressor, o qual tem em conseqüência o dever (ou a obrigação) de se abster de qualquer ato que possa de algum modo interferir naquela faculdade de fazer ou não fazer."

O jusnaturalismo é considerado o pressuposto "filosófico" do liberalismo porque ele serve para fundar os limites do poder à base de uma concepção geral e hipotética da natureza do homem que prescinde de toda verificação empírica e de toda prova histórica.

Como diz Locke: o estado de natureza é um estado de perfeita liberdade e igualdade, governado por uma lei da natureza que "ensina a todos os homens, desde que desejem consultá-la, que, sendo todos iguais e independentes, ninguém deve provocar danos aos demais no que se refere à vida, à saúde, à liberdade ou às posses".

O Estado liberal surge como uma "associação política" que deve conservar "os direitos naturais e não prescritíveis do homem". "(...) Os indivíduos têm direitos que não dependem da instituição de um soberano e a instituição do soberano tem a principal função de permitir a máxima explicitação desses direitos compatível com a segurança social. O que une a doutrina dos direitos do homem e o contratualismo é a comum concepção individualista da sociedade, a concepção segundo a qual primeiro existe o indivíduo singular com seus interesses e com suas carências, que tomam a forma de direitos em virtude da assunção de uma hipotética lei da natureza, e depois a sociedade".

"O acordo que dá origem ao Estado é possível porque, segundo a teoria do direito natural, existe na natureza uma lei que atribui a todos os indivíduos alguns direitos fundamentais de que o indivíduo apenas pode se despir voluntariamente, dentro dos limites em que esta renúncia, concordada com a análoga renúncia de todos os outros, permita a composição de uma livre e ordenada convivência".

(Continua na próxima postagem.)

Nenhum comentário: