26 de maio de 2008

A democracia na América (IV)

(Continuação da postagem anterior.)

Livro I -- Parte I -- Capítulo IV: Do princípio da soberania do povo na América.

A soberania popular nos Estados Unidos é um fator intrínseco à sua sociedade, e que surgiu desde quando eram ainda colônias inglesas. Obviamente, naquela época este princípio não podia aparecer ostensivamente, por ainda terem de obedecer à metrópole; ainda, enquanto colônias inglesas, imperou uma pequena influência aristocrática, no norte devido ao conhecimento, no sul devido a riquezas decorrentes da propriedade de terras. Este "espírito" de soberania popular ficou, então, restrito às assembléias provinciais.

Após a Revolução Americana, esta soberania popular atingiu todas as camadas da sociedade, bem como todas as esferas políticas. A democracia foi instalada em todos os Estados americanos. O povo compõe as leis, escolhe os legisladores, escolhe os representantes para o poder executivo: tudo emana do povo. A sociedade age sozinha e sobre ela própria.

Livro I -- Parte I -- Capítulo V: Necessidade de estudar o que se passa nos Estados, em particular, antes de falar do governo da União.

Antes de explicar o funcionamento da União, Tocqueville explica o funcionamento de cada Estado em particular. Ele inicia falando sobre o poder legislativo.

O poder legislativo estadual é composto de duas assembléias, o Senado e a Câmara de Representantes. O Senado é um corpo legislativo, mas às vezes torna-se um corpo administrativo, quando, por exemplo, auxilia na escolha dos funcionários do poder executivo, e participa do poder judiciário pronunciando-se sobre certos delitos políticos. A Câmara de Representantes é apenas um corpo legislativo, e só toma parte no poder judiciário quando acusa os funcionários públicos perante o Senado.

Os membros de ambas as assembléias são escolhidos pelos mesmos critérios de elegibilidade, além de serem escolhidos pelos mesmos cidadãos. A diferença é que o mandato dos senadores é mais longo do que o de um representante. O objetivo é que os senadores habituem-se aos assuntos senatoriais, além de auxiliarem aqueles que entrarem posteriormente.

O objetivo dos americanos ao criarem duas assembléias no poder legislativo foi o de conter o movimento das assembléias políticas -- em outras palavras, dividiu-se para evitar a formação de facções dentro do poder legislativo, facções estas que poderiam governar em benefício de uma minoria.

O poder executivo do Estado tem por representante o Governador. Este tem o veto suspensivo como um "aliado" contra os desejos de dominação por parte do poder legislativo. Executa as leis criadas por este poder, além de informá-lo sobre as maneiras que irá utilizar para pôr em prática a execução de tais leis.

O Governador é o chefe militar do Estado. Comanda as milícias e as forças armadas. Ele não pode intervir na administração das comunas e dos condados, e é escolhido através de eleições. Seu mandato, de um ou dois anos, faz com que ele dependa sempre da maioria que o elegeu. Dispõe do direito de veto, para manter sua liberdade em relação ao poder legislativo.

Tocqueville entra, então, no tópico referente à centralização. Define centralização governamental como a elaboração de leis gerais e as relações do povo com os estrangeiros, e centralização administrativa como a execução dos empreendimentos comunais. Tocqueville acha que a centralização governamental é essencial à prosperidade de um país, mas não o é a centralização administrativa.

Não há, segundo o autor, nenhuma centralização administrativa nos Estados Unidos; em compensação, a centralização governamental existe no mais elevado grau. Tocqueville justifica esta afirmação dizendo que, por não existirem assembléias nos distritos ou nos condados americanos, todo o poder fica concentrado nas mãos da assembléia legislativa estadual, não havendo, assim, nenhum poder capaz de lhe opor resistência. Não há como se fazer resistência à assembléia legislativa estadual também pelo fato de que ela representa a maioria, e, portanto a vontade do povo não pode ser contrariada. O poder executivo, que poderia fazer-lhe oposição, deve compelir os descontentes à obediência.

Mesmo com tal grau de centralização, há ainda algumas falhas que devem ser resolvidas. Por exemplo, Tocqueville cita o fato de que "o Estado serve-se, as mais das vezes, dos funcionários da comuna ou do condado para agir sobre os cidadãos. Assim, por exemplo, (...) é o assessor da comuna que aplica os impostos; o coletor da comuna os cobra; o tesoureiro da comuna faz chegar o seu produto ao tesouro público; e as reclamações que se fazem são submetidas aos tribunais ordinários". Tocqueville critica o fato de não haver um funcionário do Estado em cada comuna ou condado, executando as tarefas estatais e verificando se as leis, conforme foram criadas pelos Estados, estão ou não sendo cumpridas. As ações realizadas pelos Estados não chegam a resultado algum, ou nada produzem de durável, por não haver alguém que fique responsável pela sua execução; o poder estadual utiliza-se dos funcionários da própria comuna ou condado.

(Continua na próxima postagem.)

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