15 de maio de 2008

Os artigos federalistas (VII)

(Continuação da postagem anterior.)

Número LVII

Madison escreve este artigo tendo em vista a acusação de que a Câmara dos Representantes seria composta de pessoas que quisessem beneficiar uma minoria, ao invés de trabalhar em prol da maioria.

Madison diz que o objetivo de toda organização política é ter em seus quadros homens dotados de maior sabedoria para discernir o bem comum e da maior virtude para promovê-lo; ainda, tais homens devem manter estas virtudes enquanto no poder. A forma eletiva garante esta escolha do melhor, ao mesmo tempo em que faz com que os governantes tenham responsabilidades frente aos governados -- ou não serão reeleitos.

Ora, são eleitores tanto ricos quanto pobres, nobres quanto plebeus; os eleitores são os mesmos, tanto para o legislativo federal quanto para o estadual. Ainda, são possíveis representantes todos aqueles "cujo mérito possa recomendá-lo à estima e confiança de seu país". Sendo assim, não haveria por quê os eleitos beneficiarem uma determinada minoria, já que são homens virtuosos e foram escolhidos por pessoas das mais diversas facções existentes no país. Além disso, o representante tentará no mínimo manter sua base eleitoral, e porventura expandi-la. Assim, não há por quê ele beneficiar uma ou outra minoria em detrimento daqueles que o escolheram.

Um ponto importante a se destacar é o das eleições freqüentes. Elas mantêm em seus membros a "lembrança permanente de sua dependência para com o povo". Desta forma, apenas "o desempenho confiável de seu mandato" os farão credenciados à renovação do mesmo.

Outro aspecto que faz com que o representante não beneficie uma minoria é o fato de que as leis que ele criar irão valer para si próprio, não apenas para o resto da sociedade. Se, mesmo após este argumento, o representante tentasse fazer algo que o beneficiasse em detrimento de outrem, o "espírito vigilante e varonil que move o povo da América" demoveria o representante a tomar tal atitude.

Madison entra novamente no aspecto numérico da eleição, dizendo que um representante para a Câmara federal se elege com cinco ou seis mil votos, enquanto que um representante para a Câmara estadual se elege com cinco ou seis centenas de votos. Portanto, devido ao grande número de pessoas necessárias para escolher um representante federal, estas pessoas escolheriam os melhores dentre os candidatos disponíveis (com maior concorrência, os melhores são escolhidos). Madison compara ainda os Estados Unidos com a Inglaterra, aonde, para se votar, era necessária uma certa quantidade de dinheiro, e para ser eleito, mais dinheiro ainda.

Madison mostra o exemplo de vários Estados americanos, nos quais o número de pessoas necessárias para eleger um deputado estadual é quase o mesmo -- em alguns casos, chega a ser maior -- do que o número de pessoas necessárias para eleger um deputado federal. E nem por isso os legislativos estaduais beneficiam alguma minoria. Sendo assim, segundo Madison, qual o argumento que comprova que os deputados federais beneficiariam esta ou aquela minoria?

Número LXII

Neste artigo, Madison trata da organização do Senado, indo desde as qualificações dos senadores, passando pela designação dos mesmos pelos legislativos estaduais, a igualdade de representação no Senado, o número de senadores e o prazo pelo qual serão eleitos e, finalmente, os poderes conferidos ao Senado.

  1. As qualificações dos senadores: para Madison, os senadores têm de possuir uma idade maior que os representantes da Câmara, pois sua função exige maior amplitude de informação e estabilidade de caráter. Além do mais, vale lembrar que os senadores terão contato com representantes de nações estrangeiras, o que faz com que o tempo de habitação dentro de território americano também seja maior do que aquele exigido para os representantes na Câmara.
  2. A designação dos senadores pelos legislativos estaduais: segundo Madison, sendo os senadores escolhidos pelos legislativos estaduais, "recomenda-o a dupla vantagem de favorecer uma indicação selecionada e de, na formação do governo federal, dar aos governos estaduais um papel que deverá garantir sua autoridade, podendo construir o elo conveniente entre os sistemas estadual e federal"
  3. A igualdade de representação no Senado: "o voto igual concedido a todos os Estados é tanto um reconhecimento constitucional da parcela de soberania conservada por todos eles quanto um instrumento para preservá-la. Nessa medida, a igualdade deve ser tão aceitável para os Estados grandes quanto para pequenos, pois lhes interessa igualmente se proteger, por todos os expedientes possíveis, de uma consolidação indesejável dos Estados em uma república simples". Em outras palavras, a igual representação no Senado por parte dos Estados significa que estes, sejam grandes ou pequenos, terão o mesmo poder de decisão na arena política, além de garantirem a sua participação no governo federal.
  4. O número de senadores e o prazo pelo qual serão eleitos: antes de entrar nestes tópicos, Madison faz uma análise de diversos fatores que justificam a existência do Senado e, indiretamente, respondem à questão do número de senadores e do prazo do seu mandato.

  • Primeiro: O Senado funciona como um "guardião" das vontades dos Estados em relação ao governo federal. Assim, caso este resolvesse "se esquecer" dos seus compromissos assumidos para com a população, o Senado seria aquele "órgão" de controle sobre o governo. Ainda, seria muito mais difícil corromper duas instâncias do governo, quais sejam, o governo federal e o Senado.
  • Segundo: o Senado não deve ceder ao impulso de "paixões súbitas e violentas". Para evitar este problema, deve ser menos numeroso. Ainda, deve ser bastante sólido, com mandados de duração considerável.
  • Terceiro: O objetivo do Senado não é ficar revogando, explicando e emendando outras leis, e sim duas coisas: "primeiro, fidelidade ao objetivo do governo, que é a felicidade do povo; segundo, o conhecimento dos meios para melhor alcançar este objetivo". Isto significa dizer que os homens do Senado têm de ter tempo para poderem estudar as leis, ou seja, não devem dedicar-se a atividades de natureza privada. Além disso, seus mandatos têm de ter uma duração considerável, para que a pessoa possa se dedicar à função pública.
  • Quarto: Necessidade de uma instituição estável no governo. Como os mandatos da Câmara dos Representantes são curtos, o que significa haver uma grande rotatividade dos seus membros, é preciso que uma das casas do legislativo tenha longa duração, para que não haja uma constante mudança de opiniões, nem mudança de diretrizes.

Madison passa a citar, então, alguns "efeitos perniciosos" de um governo mutável. O primeiro deles é que um governo mutável "solapa o respeito e a confiança de outras nações e todas as vantagens associadas ao caráter nacional". Isto significa dizer que as outras nações não terão respeito em relação à nação que muda seu Senado constantemente, além de quererem tirar proveito da mesma sempre que possível.

Outro problema da mudança constante dos membros do Senado é interno. Com mudança constante, seriam criadas leis "demais", e as pessoas não saberiam, ou conseguiriam, viver com e nem mesmo compreender tantas leis.

Além disso, este grande número de leis pode beneficiar pessoas inescrupulosas, que têm conhecimento de alguma lei específica, em relação àquelas que não têm este conhecimento. Assim, poderia ser dito que tal lei foi feita para a minoria, em detrimento da maioria.

Também o comércio é prejudicado com esta instabilidade, pois um comerciante que queira implantar um novo negócio pode ter seu projeto totalmente desfeito caso uma nova lei, feita por um novo senador, atrapalhe a implantação do seu novo negócio. Como o próprio Madison diz, "nenhum grande avanço ou empreendimento meritório que exija os auspícios de um sistema estável de política nacional poderá ter prosseguimento".

O pior efeito da instabilidade, entretanto, é para Madison a "perda de lealdade e reverência que se produz nos corações das pessoas com relação a um sistema político que revela tantos sinais de enfermidade e desaponta tantas de suas agradáveis esperanças". Madison acha que "nenhum governo (...) será respeitado por muito tempo sem que seja realmente respeitável; nem será verdadeiramente respeitável sem possuir certa parcela de ordem e estabilidade".

(Continua na próxima postagem.)

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