10 de dezembro de 2008

Humanismo e Política (I)

O Humanismo, também chamado de Renascença, é a “ideologia” típica da Idade Moderna. É um movimento cultural que busca, em um primeiro momento, resgatar e imitar os conhecimentos da cultura greco-romana e, posteriormente, criar suas próprias obras tendo como base o homem, que passa a ser o centro da atenção humana. É importante ressaltar que os artistas desta época buscavam, nos antigos, um estímulo à sua própria imaginação, e não um modelo a ser copiado. O movimento surgiu na Itália e, de lá, propagou-se aos outros países.

O que mais se destaca na Renascença é a abundância de gênios e talentos extraordinários. Mesmo não havendo pensadores como Aristóteles e Platão, outros campos da cultura, como a arte, a música e a literatura, destacam-se profundamente.

Este movimento pode ser explicado como uma conseqüência do feudalismo. O homem percebe que ocupa um lugar no mundo, e passa a “coloniza-lo” efetivamente obviamente, as atenções são todas para o próprio homem: ele quer provar que é capaz de realizar o que quiser.

A anatomia humana é a primeira área beneficiada pela Renascença. Pintores chegam a dissecar cadáveres para conhecer com exatidão o interior do corpo humano. E o objetivo não é só exaltar o homem: é necessário educa-lo também.

A religião não é esquecida: apenas o seu foco muda. O homem passa a ser visto como um microcosmo, como um ser feito por Deus mas que precisa se preocupar também com o seu habitat material. O homem pode modificar, melhorar, recriar o local onde vive. O homem tem o livre-arbítrio para escolher entre as coisas inferiores, degenerando-se, ou as superiores, regenerando-se.

O que marca a Renascença é a experimentação, ou seja, o homem não mais acredita nas coisas por questões teológicas ou filosóficas, e sim por experiência própria. E o homem utilizará esta experiência em proveito próprio, vendo como a natureza funciona para poder manipula-la. É o embrião da ciência.

Um dos grandes nomes do período renascentista, talvez até mesmo o maior nome, é Leonardo da Vinci. Ele dizia que o homem, para poder criar obras que sejam entendidas e que produzam os sentimentos originais do autor, o mesmo deve “transformar-se na própria natureza”. O artista deve ser também cientista e filósofo.

Há quem afirme que a Renascença é eminentemente pagã e anticristã. Contudo, quando os renascentistas dizem que vão à busca do antigo, eles não estão renegando a ideologia cristã, pois os renascentistas baseiam-se nos antigos para legitimar sua própria fé. Outro aspecto renascentista, o da criação do novo, também não é anticristão, pois o espírito renascentista é a própria manifestação do poder e da bondade de Deus. Os próprios artistas tinham consciência de que eles eram a manifestação de Deus. Por fim, a valorização do homem, também característica da Renascença, não tem nada de anticristão. Pelo contrário, é a exaltação do homem como criatura feita por Deus, e à Sua imagem e semelhança. O homem se engrandece com a beleza, a inteligência e o gênio, mas só atinge a perfeição através de Deus.

O problema da Renascença é que ela supervalorizou o homem de maneira unilateral, fazendo-o achar que criou Deus, e não que foi criado por Ele. Esta mentalidade levou ao antropocentrismo absoluto, isto é, ao ateísmo.

Dois humanistas não-italianos merecem destaque. Erasmo de Roterdam e Thomas Morus. O primeiro tornou-se monge porque era nos mosteiros que o movimento humanista iniciou-se. Contudo, não se sentiu à vontade com a vida ascética, e por isto saiu do convento.

Atingiu o sucesso com o livro Elogio da Loucura, no qual satirizou tudo e todos: homens, instituições e costumes. Erasmo, contudo, generalizou demais, e não levou em conta as honrosas exceções. Suas críticas, contudo, são boas, pois compara as atitudes dos papas e bispos com as de Jesus. Tem um estilo bastante racionalista e crítico.

Procurou revelar as fontes originais e puras da Igreja, através da tradução do original grego do Novo Testamento e da reedição de livros dos santos padres. Buscou também reconciliar Lutero e o papa, mas sua tentativa foi frustrada. Foi repudiado tanto pelos reformistas quanto pelos católicos, e morreu sem ter suas idéias de paz e conciliação postas em prática.

O segundo humanista foi o inglês Thomas Morus. Foi um humanista cristão e, por isto, reprovou o divórcio do rei Henrique VIII, além de não o reconhecer como chefe da Igreja Anglicana.

A grande diferença entre Erasmo e Morus é que este faz uma crítica muito mais moderada e, principalmente, respeitosa à Igreja Católica. Tais críticas e idéias foram expostas em seu livro intitulado Utopia.

Neste livro, Morus expõe como corrigir os males e desajustes da sociedade, dos quais derivam a tirania e a corrupção política, além do abuso da propriedade privada no campo econômico. Ele propõe a reformulação do direito de propriedade e a reorganização das relações econômicas.

Mesmo com esta “explosão” renascentista, alguns itens ficaram a desejar. O uso do latim na grande maioria dos escritos, por exemplo, colocou em segundo plano as línguas nacionais. Além disto, a Renascença não atingiu as classes pobres e incultas, nem como mentalidade, nem como transformação.

Entretanto, mesmo levando-se em consideração tais falhas, pode-se dizer que a Renascença foi o início da sociedade atual. A valorização do homem, o desenvolvimento científico e tecnológico e o próprio conhecimento atual das civilizações antigas são conseqüências da Renascença.

2 comentários:

Âgesagesse disse...

Olá Professor Matheus !
Fiquei fascinada com sua experiência nesta viagem. Realmente "viver a história" é nascer de novo: mais maduro e ciente do seu papel na coletividade. Populações que sofreram com guerras têm este espírito de coletividade mais desenvolvidos.
Será que o "despertar" de nosso povo também terá que ocorrer por este mesmo processo?
Obrigada pela atenção. Lucimar

Maritaca disse...

Ótima narrativa calçada na história. Me fez pensar quão profundas são os reflexos disso na nossa cultura. O Renascimento ocidentalizou o mundo, se se pode pensar assim. Mas o que fica em profundidade é a questão da universalização da humanidade pelo movimento renascentista que inalgura a modernidada. A leitura do texto expõe de modo velado que só existia uma humanidade, uma raça e que o humanismo nada tinha de universal pois foi calçado nele, em alguma medida, que as invasões e escravisaçoes ocorreram. Eduard Saudades fala sobre isso no livro, Ocidentalismo.