5 de novembro de 2007

Voltando a falar de Marx (II)

Onde Tudo Começou?

Karl Marx nasceu em 1818 e teve a chance de presenciar os maiores acontecimentos e as maiores transformações ocorridas no século XIX. Ele narra tais transformações e pode-se dizer que sua narração fora a mais perfeita que qualquer homem conseguira produzir acerca de sua época contemporânea. Foi Marx quem melhor desenhou o avanço da burguesia e do proletariado no sistema social e a formação do capitalismo industrial, além da consolidação do estado moderno, em um mundo conturbado, envolvido por transformações políticas e sociais.

Marx nasceu em um tempo em que o pensamento hegeliano predominava na Alemanha. Na França, lugar que ainda estava sob a euforia da Revolução Francesa, surge o pensamento socialista a partir dos movimentos sociais que aspiravam ao sufrágio universal para a maior participação de todo o povo no processo político. Na Inglaterra, a luta pelos direitos de participação política dos trabalhadores era baseada no movimento cartista. Foi nesse período -- no qual a Europa lutava pela formação de um estado mais social, tendo os trabalhadores chances reais de participação efetiva no processo político -- que Marx começou a estruturar seu pensamento socialista.

Após ser tutelado intelectualmente por Hegel, Marx começa seus estudos nos anos 40 do século XIX com o direito, a história e a filosofia buscando se contrapor o pensamento de Hegel. Na seqüência, Marx entra no período de sua vida jornalística publicando artigos fundamentalmente na Gazeta Renana. Logo em seguida Marx volta seus estudos para a economia escrevendo sua maior obra O Capital (1867), obra essa na qual Marx põe-se a analisar e criticar a economia capitalista.

Marx, quando considerado um "jovem hegeliano", inicia o seu desenvolvimento intelectual com a crítica à religião, baseando-se principalmente nas idéias de Feuerbach que vão chocar quase por completo com as idéias de Hegel. Feuerbach troca o idealismo hegeliano pela visão do "materialismo real" para explicar os fundamentos que determinam a sociedade. Nesse contexto ideológico, na pseudo-dicotomia Hegel-Feuerbach, Marx faz uma exposição do materialismo de forma sistemática, referindo-se a esse como um “fio condutor” de seus estudos.

As ideologias fundamentam-se nas condições materiais de vida, porém as ideologias tendem a direcionar-se a utopias para a resolução dos problemas de existência humana no campo do materialismo. O materialismo definirá para Marx o "tipo racional" do capitalismo, que torna o dinheiro o fator determinante nas relações sociais. O dinheiro é o símbolo do capitalismo, nitidamente materialista na concepção de Marx. Ele argumenta ainda que "o dinheiro é o símbolo da auto-alienação humana sob o capitalismo já que ele reduz todas as qualidades humanas a valores quantitativos de troca" (GIANNOTTI, 1999, p. 58). O capitalismo serve para ilustrar um "materialismo real" defendido por Marx como o verdadeiro materialismo carregado de ideologias dominantes.

Os escritos de Marx refletem o momento histórico no qual ele vivia, e sua obra pode ser destacada pelo fato dele utilizar os pensamentos políticos de forma mais consciente. Ao mesmo tempo em que adere a correntes de pensamento da época, ele se distancia das mesmas formando uma corrente de pensamento própria.

Classes e Estado

Marx não elaborou uma concepção de classes propriamente dita, mas o estudo das classes é uma preocupação fundamental nos seus trabalhos. Resumidamente, Marx descreve a existência de duas classes, uma dominada e outra dominadora, na disputa pelo poder, sendo que dentro dessas duas classes a fragmentação é traço importante, pois essa fragmentação admite o surgimento de "subclasses" envolvidas e de forma geral unidas na batalha das classes. Rigorosamente por repetição de idéias com argumentos diferenciados Marx afirma repetidamente que o poder político sempre está concentrado nas mãos das classes economicamente dominantes, pois sãos essas que detém os meios de produção.

Marx, em sua teoria de economia política, afirma estar associado ao poder político o poder econômico, ou seja, um indivíduo não pode possuir poder político sem possuir poder econômico, sendo raras as exceções. A mobilidade social para Marx acontece, entretanto, em proporções reduzidas, sendo poucos os casos em que um indivíduo, ou um grupo de indivíduos adquire por méritos próprios ascensão social.

Marx admite que o capitalismo muito contribui para o processo de produção, já que este, no âmbito da produção, é de grande eficiência. Entretanto, lembra Marx, o capitalismo, além de ser um sucesso como grande incentivador da produção, garante o funcionamento de uma sociedade desequilibrada socialmente.

Como grande conhecedor do capitalismo, Marx discute as contradições que neste existem e sugere uma teoria na qual as classes teriam os mesmos benefícios (igualdade entre as classes), mas ao entrelaçar a teoria à prática, Marx encontra seriíssimas dificuldades, tendo em vista que o pensamento europeu no século XIX estava carregado de um romantismo que dificulta a aplicação prática das teorias. Além disso, as teorias de Marx sugeriam uma nova grande revolução, assustando ainda mais o povo cheio de medos e problemas sociais.

Marx acreditava que o fim do capitalismo era inevitável devido às suas grandes contradições que faziam com que ele se auto-destruísse. Isso quer dizer que a revolução chegaria inevitavelmente com o desmoronamento do capitalismo. Esse determinismo marxista afirma que, assim como pela lei da gravidade um objeto está determinado a cair, o capitalismo está determinado à sua auto explosão, pois ele alimenta os monstros de sua própria destruição.

Para Marx, o estado capitalista está inclinado para uma classe social dominante, e este mesmo estado utiliza a legitimidade da coerção física para além de garantir as leis beneficiar uma classe dominante. Para evitar essa forma de relação entre o estado e as classes, Marx sugere a destituição do estado ou a não existência de classes distintas, que levaria o estado necessariamente a visar um bem-estar geral. Como Marx não está inclinado ao anarquismo, garante ser a segunda sugestão a melhor, além de ser a mais viável.

Marx defendia que em todo o percurso da história a luta de classes era de fato existente, e com o desenvolver do capitalismo a luta entre a burguesia e os proletários ilustrou fielmente essa sua concepção. Na teoria de Marx, o estado capitalista é apenas um aparelho responsável pela manutenção dos desejos da classe dominante: a burguesia. Marx afirmava então que o estado, no capitalismo, funcionava apenas para manter a burguesia no domínio. Isso implica que a classe que detém o poder econômico por via de regra detém também o poder político, como acima já fora mencionado. O estado está diretamente relacionado com a classe dominante, afastando-se desta apenas para tentar oferecer às classes dominadas condições mínimas de sobrevivência, como saneamento básico, hospitais e escolas, mesmo que em condições precárias.

O estado, em países como a Inglaterra no século XIX, regulamentou a diminuição e a fixação da jornada de trabalho. Isso levou muitos a perguntar: o que leva o estado a regulamentar a diminuição e a fixação da jornada de trabalho sendo o próprio estado o representante máximo da burguesia, e essa, por sua vez, possui o conhecimento de que quanto maior for a jornada de trabalho maior será a mais-valia absoluta sobre o proletário? Marx, para responder a essa pergunta, explica que isso ocorreu devido à vontade da burguesia de manter o proletário satisfeito com o trabalho. Apesar disso, Marx vê a burguesia como uma classe incapaz de cumprir a função básica de uma classe dominante, que é o de garantir condições mínimas de sobrevivência para a classe dominada. "O operário moderno [...], ao invés de elevar-se com o progresso da indústria, desce sempre, mais e mais, por baixo das condições de vida de sua própria classe. O trabalhador cai na miséria e o depauperismo cresce mais rapidamente ainda que a população e a riqueza. É, pois, evidente que a burguesia já não é capaz de continuar desempenhando o papel de classe dominante da sociedade, nem de impor a esta, como lei reguladora, as condições de existência de sua classe" (MARX; ENGELS, 1999, p. 48).


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