(Continuação da postagem anterior.)
Em novembro de 1991, depois das mudanças na composição do governo russo, podemos falar de um novo estágio na “ideologia” da privatização, e uma intensificação abrupta de esforços para garantir a implementação prática da política de privatização. Assumindo que a privatização era um dos elementos-chave da reforma econômica, o governo de Yeltsin e de Gaidar intensificou seus esforços na área do desenvolvimento de uma legislação específica para a privatização, mas ao mesmo tempo este governo ainda não tinha uma oportunidade “real” de monitoração operacional do processo de privatização. Foi por isso que uma das características específicas da reforma econômica daquele governo foi a liberalização dos preços antes de um período de privatização em larga escala, que foi além da ortodoxia teórica dominante na área da transição para o mercado e estava em contradição com a experiência de alguns outros países. Havia, porém, algumas razões para esta liberalização abrupta dos preços:
- Era impossível esperar pelo fim da privatização em larga escala conduzida de uma maneira tradicional (ou seja, durante vários anos), por causa da extrema escassez de produtos em 1991 e 1992;
- Se os preços não fossem liberados, qualquer empresa de propriedade estatal realmente se tornaria uma “entidade estatal”, pois ela teria de administrar a distribuição de bens com pouca oferta, o que o governo não queria;
- Estava ocorrendo uma privatização “espontânea” intensiva, e se os preços não fossem liberados, essa privatização “espontânea” poderia cessar.
Em 29 de dezembro de 1991 o Presidente da Federação da Rússia assinou o decreto “Sobre a Aceleração da Privatização de Empresas Estaduais e Municipais”. Foram também criadas as “Provisões Fundamentais sobre o Programa de Privatização de Empresas Estaduais e Municipais na Federação da Rússia em 1992” (Radygin, 1995, 49). A implementação dessas provisões começou em primeiro de janeiro de 1992. As Provisões Fundamentais realmente se tornaram o primeiro documento que forneceu algum tipo de regulação para o processo de privatização e deu o início à privatização já programada para a Rússia (opondo-se à privatização “espontânea”).
O decreto do Presidente da Federação da Rússia “Sobre a Aceleração da Privatização de Empresas Estaduais e Municipais” continha sete regulações departamentais normativas que davam detalhes em como implementar a Lei de Privatização e as Provisões Fundamentais, além de definir certas regras para o procedimento da privatização (procedimentos sobre a aplicação da privatização, sobre a avaliação do valor de uma empresa, sobre tornar as empresas estatais companhias joint stock, sobre ações, sobre o uso de fundos de incentivo econômico no processo de privatização e sobre a operação das comissões que tratavam do processo de privatização). Entretanto, a experiência dos primeiros meses de implementação prática do “pacote” mostrou que todas essas regulações tinham problemas. O atraso foi causado por uma operação e coordenação ruins dos atores envolvidos em vários níveis, pelo treinamento ruim dos profissionais da área, pela dominação de métodos políticos ao invés de métodos democráticos, além da própria natureza complexa dos detalhes técnicos envolvidos no “pacote” e por certos defeitos da própria documentação.
RECURSOS ORGANIZACIONAIS E HUMANOS
É importante identificarmos também outros aspectos relativos a este processo de privatização, como, por exemplo, a demanda por esta política, o resultado dessa demanda, o resultado da própria política e os impactos políticos resultantes da implementação.
No que diz respeito à demanda por uma política de privatização, vale lembrar que as privatizações já estavam acontecendo de forma velada durante o próprio regime socialista, ainda quando da existência da União Soviética, conforme dito na primeira parte deste trabalho. Por outro lado, logo após o fim da União Soviética, o ambiente político era favorável a um ajuste econômico – no qual se inclui a privatização – baseado em políticas neoliberais até certo ponto impostas pelo Ocidente. O resultado dessa “demanda neoliberal” foi o processo de privatização em si, teoricamente buscando uma melhor redistribuição e uma maior eficiência do Estado, mas trazendo como conseqüência o aprofundamento da crise social, política e econômica àquele país.
Os aspectos administrativos e burocráticos da privatização foram confiados ao Comitê Estatal da Federação da Rússia para a Coordenação da Propriedade Estatal (GKI), um órgão do governo, enquanto que a “venda real” das propriedades foi organizada e realizada pelo Fundo Federal Russo sobre Propriedade, que operou sob o comando de Boris Yeltsin (Radygin, 1995, 47). No que se refere a recursos organizacionais, portanto, o projeto tinha o total apoio dos principais órgãos do governo russo.
(Continua na próxima postagem.)
Em novembro de 1991, depois das mudanças na composição do governo russo, podemos falar de um novo estágio na “ideologia” da privatização, e uma intensificação abrupta de esforços para garantir a implementação prática da política de privatização. Assumindo que a privatização era um dos elementos-chave da reforma econômica, o governo de Yeltsin e de Gaidar intensificou seus esforços na área do desenvolvimento de uma legislação específica para a privatização, mas ao mesmo tempo este governo ainda não tinha uma oportunidade “real” de monitoração operacional do processo de privatização. Foi por isso que uma das características específicas da reforma econômica daquele governo foi a liberalização dos preços antes de um período de privatização em larga escala, que foi além da ortodoxia teórica dominante na área da transição para o mercado e estava em contradição com a experiência de alguns outros países. Havia, porém, algumas razões para esta liberalização abrupta dos preços:
- Era impossível esperar pelo fim da privatização em larga escala conduzida de uma maneira tradicional (ou seja, durante vários anos), por causa da extrema escassez de produtos em 1991 e 1992;
- Se os preços não fossem liberados, qualquer empresa de propriedade estatal realmente se tornaria uma “entidade estatal”, pois ela teria de administrar a distribuição de bens com pouca oferta, o que o governo não queria;
- Estava ocorrendo uma privatização “espontânea” intensiva, e se os preços não fossem liberados, essa privatização “espontânea” poderia cessar.
Em 29 de dezembro de 1991 o Presidente da Federação da Rússia assinou o decreto “Sobre a Aceleração da Privatização de Empresas Estaduais e Municipais”. Foram também criadas as “Provisões Fundamentais sobre o Programa de Privatização de Empresas Estaduais e Municipais na Federação da Rússia em 1992” (Radygin, 1995, 49). A implementação dessas provisões começou em primeiro de janeiro de 1992. As Provisões Fundamentais realmente se tornaram o primeiro documento que forneceu algum tipo de regulação para o processo de privatização e deu o início à privatização já programada para a Rússia (opondo-se à privatização “espontânea”).
O decreto do Presidente da Federação da Rússia “Sobre a Aceleração da Privatização de Empresas Estaduais e Municipais” continha sete regulações departamentais normativas que davam detalhes em como implementar a Lei de Privatização e as Provisões Fundamentais, além de definir certas regras para o procedimento da privatização (procedimentos sobre a aplicação da privatização, sobre a avaliação do valor de uma empresa, sobre tornar as empresas estatais companhias joint stock, sobre ações, sobre o uso de fundos de incentivo econômico no processo de privatização e sobre a operação das comissões que tratavam do processo de privatização). Entretanto, a experiência dos primeiros meses de implementação prática do “pacote” mostrou que todas essas regulações tinham problemas. O atraso foi causado por uma operação e coordenação ruins dos atores envolvidos em vários níveis, pelo treinamento ruim dos profissionais da área, pela dominação de métodos políticos ao invés de métodos democráticos, além da própria natureza complexa dos detalhes técnicos envolvidos no “pacote” e por certos defeitos da própria documentação.
RECURSOS ORGANIZACIONAIS E HUMANOS
É importante identificarmos também outros aspectos relativos a este processo de privatização, como, por exemplo, a demanda por esta política, o resultado dessa demanda, o resultado da própria política e os impactos políticos resultantes da implementação.
No que diz respeito à demanda por uma política de privatização, vale lembrar que as privatizações já estavam acontecendo de forma velada durante o próprio regime socialista, ainda quando da existência da União Soviética, conforme dito na primeira parte deste trabalho. Por outro lado, logo após o fim da União Soviética, o ambiente político era favorável a um ajuste econômico – no qual se inclui a privatização – baseado em políticas neoliberais até certo ponto impostas pelo Ocidente. O resultado dessa “demanda neoliberal” foi o processo de privatização em si, teoricamente buscando uma melhor redistribuição e uma maior eficiência do Estado, mas trazendo como conseqüência o aprofundamento da crise social, política e econômica àquele país.
Os aspectos administrativos e burocráticos da privatização foram confiados ao Comitê Estatal da Federação da Rússia para a Coordenação da Propriedade Estatal (GKI), um órgão do governo, enquanto que a “venda real” das propriedades foi organizada e realizada pelo Fundo Federal Russo sobre Propriedade, que operou sob o comando de Boris Yeltsin (Radygin, 1995, 47). No que se refere a recursos organizacionais, portanto, o projeto tinha o total apoio dos principais órgãos do governo russo.
(Continua na próxima postagem.)
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